No último dia 19 de julho, a Academia Nacional de Medicina realizou o mini simpósio “Vacinação”, promovendo esta importante discussão para o atual cenário do Rio de Janeiro e do Brasil. No último ano, o mundo registrou recorde de crianças vacinadas – 123 milhões, segundo dados da Unicef e OMS (Organização Mundial da Saúde) – uma alta que ocorre tanto por aumento da população quanto de cobertura vacinal. O Brasil, no entanto, sofreu queda na porcentagem de crianças vacinadas nos últimos três anos. O recente surto de sarampo no país – 677 casos confirmados da doença e outros 2.724 em investigação -, dois anos após alcançar o certificado de eliminação, também despertou a atenção para o debate de questões que buscam reverter esse movimento.
O Acadêmico Celso Ferreira Ramos Filho, organizador do evento ao lado do Acad. José Carlos do Valle, deu início à rodada de palestras apresentando o tema “Vacina – de Voltaire a Sabin, e a quem ainda vier”, onde abordou o processo de evolução das vacinas e sua contribuição na erradicação de epidemias ao longo da história. O especialista versou sobre o impacto de doenças como varíola, sarampo e poliomielite na história do mundo antes da descoberta da vacina, e a erradicação dessas doenças nas décadas que seguiram o início das vacinações.
O infectologista pontuou episódios importantes para a descoberta da vacina contra a varíola, começando por Voltaire, que descreveu em suas cartas os efeitos da doença, passando por Edward Jenner – que normatizou o método de inoculação da “varíola de vaca” em experimentos e teve seus trabalhos e pesquisas recusados pela Royal Society da Inglaterra, publicando-os apenas um ano depois, em 1798 -, até Oswaldo Cruz, um século mais tarde no Brasil, com a vacinação compulsória que resultou na Revolta da Vacina em 1904. Dr. Celso Ramos Filho destacou a resistência da sociedade em ambas as situações e discorreu sobre como a desinformação contribuiu para o prolongamento de epidemias que poderiam ter sido interrompidas anteriormente por meio da prevenção.
Por fim, o Acadêmico explicou como se deu o processo de vacinação no Brasil, destacando a criação do Instituto Soroterápico Federal, em 1900, que se tornou o Instituto Oswaldo Cruz 7 anos depois; a instauração da Lei Orgânica das Campanhas Sanitárias, do Plano Nacional de Controle da Poliomielite (1971) e do Programa Nacional de Imunizações (1973); e a certificação de erradicação da varíola no Brasil, pela OMS, em 1973 e sua erradicação mundial, em 1977. Concluiu ressaltando a importância do papel da população e sua responsabilidade em relação à imunização pessoal e coletiva para a interrupção da transmissão de doenças.
Em seguida, a Dra. Cláudia Mello, subsecretária de vigilância em saúde da Secretaria de Estado de Saúde do Rio de Janeiro, ministrou a palestra “Cenário Epidemiológico e Vacinal no Brasil e no Rio de Janeiro”, na qual esclareceu o trabalho de pesquisa desenvolvido pela subsecretaria de Vigilância em Saúde e os projetos de implementação e ações de controle e informação populacional para a prevenção de doenças. Abordou principalmente as epidemias de influenza, poliomielite, sarampo, e suas respectivas campanhas vacinais.
Segundo ela, as taxas históricas de adesão e cobertura da vacina para poliomielite são estáveis desde 1994, por se tratar de uma campanha já fomentada e conhecida pela população. No entanto, os índices de cobertura vacinal ficaram abaixo do nível previsto pelo Ministério da Saúde nos dois últimos anos. As taxas de adesão da segunda dose da vacina do sarampo sofreram uma queda entre 2013 e 2017, atingindo a meta de cobertura apenas no ano de 2014.
Neste ano o Ministério da Saúde confirmou o retorno da doença – 677 casos confirmados no último balanço de 18 de julho. O surto atinge principalmente a região norte do país e seu avanço já causou ao menos duas mortes até o momento.
A subsecretária concluiu sua apresentação indicando ações permanentes de fortalecimento de vigilância epidemiológica da Secretaria de Saúde do Estado do Rio de Janeiro e os desafios da vacinação. Dentre as principais medidas estão a emissão de alertas e divulgação de dados, incremento de visitas e treinamentos aos municípios do estado para a ações de rotina e surtos, ações em parceria com Academias científicas, conselhos de classe e grupos de trabalho. Declarou finalmente que a vacinação de rotina dos suscetíveis ainda é a melhor prevenção contra doenças e apesar de todo o avanço tecnológico na medicina, a vacinação continua sendo necessária e importante.
Em palestra intitulada “Vacinação: A prevenção das oportunidades perdidas”, a Presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações, Isabella Ballalai, ressaltou a importância da comunicação ampla entre médicos, profissionais de saúde e população a respeito da continuidade e investimento no processo de vacinação ao longo de toda a vida do indivíduo para manutenção e erradicação de doenças. A médica elucidou ainda possíveis aspectos que contribuíram para o recente movimento antivacina, e como combatê-lo.
A especialista afirmou que, ao contrário do que se acredita, o principal fator causador queda nas taxas de vacinação ocorre não é o medo da população – segundo pesquisas, apenas 4% da população brasileira não acredita na eficácia da prevenção –, apesar do número estar crescendo por conta da divulgação de fake news relacionadas a temas de saúde. Segundo dados apresentados por ela, a sociedade tende a parar de se vacinar quando determinada doença está erradicada, o que leva a crer que não há necessidade de prevenção, resultando no retorno da doença, como é o caso do sarampo. Da mesma forma, as taxas de vacinação são maiores para doenças com grande repercussão midiática, como ocorreu com a epidemia de Influenza em 2014.
Concluindo sua apresentação, a Dra. Ballalai reiterou importância do melhor preparo dos profissionais de saúde para esclarecer dúvidas de pacientes sobre fake news e a inclusão e recomendação da vacina em prescrições médicas. Ressaltou a relevância da criação de estratégias inteligentes de imunização para o sarampo e da atualização profissional na educação e busca de informações sobre a doença. Por fim, respondeu perguntas frequentes sobre a vacinação contra sarampo, como quem deve ou não tomar a vacina – não se recomenda para menores de 12 meses, imunodeprimidos e gestantes, enquanto mulheres amamentando podem se vacinar.