TRANSTORNO BIPOLAR

09/09/2015

O transtorno bipolar do humor (TB) era antigamente denominado de psicose maníaco-depressiva. Esta nomenclatura deixou de ser utilizada nas classificações atuais porque este transtorno não apresenta necessariamente sintomas psicóticos. A principal característica do TB são os episódios de aceleração psicomotora e humor eufórico. A fase depressiva não é obrigatória para o diagnóstico, apesar de muito frequente.

O TB caracteriza-se por oscilações importantes do humor entre os pólos da exaltação (tecnicamente denominada de “mania”) e depressão, apresenta curso recorrente e crônico, implicando em elevado grau de morbidade e incapacidade para os indivíduos. Atinge em torno de 2% da população ao longo da vida.

O início do TB geralmente se dá em torno dos 20 a 30 anos de idade, porém pode surgir em qualquer idade. O início da apresentação clínica do TB pode ser tanto uma fase depressiva como uma fase maníaca, evoluindo gradualmente ao longo de semanas, meses ou abruptamente em poucos dias. Além dos quadros depressivos e maníacos, há também os quadros mistos (sintomas depressivos simultâneos aos maníacos) o que muitas vezes confunde os médicos, retardando o seu diagnóstico.

Os três componentes fundamentais na sintomatologia do TB: nível de humor; atividade psíquica e atividade motora. Tipicamente, na mania estas funções são elevadas, enquanto na depressão são diminuídas.

A fase depressiva do TB é caracterizada principalmente por alterações do humor, da psicomotricidade, da cognição e das funções vegetativas. Geralmente o paciente apresenta humor depressivo, alterações de apetite e do sono, dificuldades de concentração e pensamentos de conteúdo pessimista, incapacidade de sentir alegria ou prazer, redução da energia, lentificação psicomotora, podendo ocorrer ideação suicida e/ou sintomas psicóticos. O paciente deprimido manifesta o humor depressivo. Os reflexos mais típicos desse tipo de humor são os sintomas de angústia, tristeza, vazio, desesperança e desânimo.

Os deprimidos podem perder a capacidade de sentir prazer, o que os leva ao abandono de atividades anteriormente prazerosas e ao desinteresse por amigos e familiares. Em casos mais graves pode haver incapacidade de experimentar qualquer tipo de emoção, dando a impressão que nada mais interessa ou vale a pena.

Todos os seres humanos têm em si todos os sentimentos e emoções que fazem parte, naturalmente do seu mecanismo fisiológico, mas, o equilíbrio é fundamental para que se viva em harmonia. As manifestações contidas ou expressas devem ser proporcionais aos eventos cotidianos e não superdimensionadas. Os impulsos emocionais descontrolados turvam a razão e provocam atos impensados quase sempre de consequências desastrosas.

O paciente com TB apresenta, na maioria das vezes, baixa autoestima e autoconfiança em consequência das ideias constantes de inutilidade, culpa e devido à desarmonia que promove ao seu redor. De um modo geral, tem seu sono perturbado, apetite diminuído e concentração e atenção reduzidas.

O primeiro passo para qualquer tratamento ser bem-sucedido é a pessoa reconhecer que precisa de ajuda e querer se tratar. O apoio, a presença e a consciência da família quanto à doença são essenciais no processo de recuperação. Um equívoco no tratamento é o paciente achar que as soluções vêm magicamente de alguém para ele, de um membro da família, do médico ou do psicólogo. Os familiares também não devem se sentir culpados ou responsáveis por uma trajetória que é do outro. Uma coisa é ser solidário e apoiar, outra é deixar de viver a própria vida em função de um problema que só o outro pode resolver. O paciente por sua vez exige muita atenção e faz com que o familiar se sinta culpado por não ficar à “disposição” dos seus humores, desejos e vontades.

Após avaliação física, se ainda persistir qualquer alteração de personalidade ou de comportamento significativa, o indivíduo ou a família devem buscar o médico psiquiatra que é o profissional mais indicado para realizar o diagnóstico e conduzir o tratamento. As observações do psiquiatra, não são de fatos evidentes, no psiquismo não existe território conhecido, os diagnósticos são elaborados através do conhecimento da personalidade, da história familiar e pessoal do paciente, da observação dos fenômenos e do estudo de exames e testes neuropsicológicos.

Podemos dividir o tratamento medicamentoso no transtorno bipolar em três momentos principais: 1960s/1970s, décadas caracterizadas pelo início do uso do carbonato de lítio e de antipsicóticos; 1980s, marcada pelo uso de carbabazepina e ácido valproico; e 1990s, pela chegada dos novos anticonvulsivantes e antipsicóticos atípicos.

No tratamento da fase aguda de episódios de mania são rotineiramente utilizados o carbonato de lítio, ácido valproico/valproato de sódio, antipsicóticos e eletroconvulsoterapia (ECT), isoladamente ou em associação.

Nos casos de TB é comum que o psiquiatra, em seguida a sua avaliação, encaminhe o paciente para o acompanhamento psicoterápico. Em conjunto, a medicação aliada à terapia, costuma restabelecer o equilíbrio emocional do indivíduo devolvendo-lhe a qualidade de vida. Num primeiro momento, a medicação serviria como um agente facilitador na retomada desse equilíbrio e, num segundo momento ou em conjunto, o acompanhamento psicológico como suporte, orientação e manejo dos sintomas.

A Terapia cognitivo-comportamental (TCC)é uma terapia breve e bem indicada no caso do TB, pois, ajuda o paciente a compreender suas reações emocionais em termos cognitivos, comportamentais e fisiológicos, ou seja, do que pensa, faz e sente. O paciente começa a observar que o comportamento atual surge como resultado de um pensamento inicial que se escolheu ter. A transformação de um pensamento negativo em positivo e o encontro de novos significados para antigas questões resulta na reformulação da maneira de se pensar os problemas. Essas reformulações no pensamento são conhecidas na TCC como reestruturações cognitivas.

O paciente com TB deve procurar ter consciência das suas oscilações de humor para aprender a lidar com elas. Entendendo e reconhecendo a fase em que você se encontra, é mais fácil perceber como manejá-la. Mudar o modo de pensar é escolher mudar o modo de sentir. Quanto mais o paciente se conhece e conhece o TB, mais capacidade tem de manejar suas questões e de se inserir de maneira satisfatória no tratamento.

No TB o entendimento das fases dos estados de humor e de como lidar com elas, capacita o paciente para uma vida produtiva, ao contrário daquela postura anterior, cheia de incapacidades limitantes. Com as mudanças de comportamento, e com os ganhos sociais e pessoais que acompanham as modificações, o sujeito vai readquirindo estabilidade e condições físicas e emocionais de dar a volta por cima.

Para o tratamento eficaz é necessário, tanto para o paciente quanto para os familiares, a informação ampla sobre a doença. Quanto mais informada uma pessoa, mais opções, escolhas, julgamento e ponderação terá para tomar decisões. A partir de estarmos cientes do processo é que poderemos questionar, levantar hipóteses e vislumbrar possibilidades. Assim, aumentamos os acertos e diminuímos a margem de erros.

A seguir algumas sugestões para se planejar uma vida saudável e equilibrada: alimentação adequada, sono reparador, atividades físicas regulares, manutenção de cuidados pessoais, evitar o uso de álcool e drogas, realização de exames periódicos e principalmente, o controle de traços indesejáveis de personalidade.

Quando gozamos de boa saúde, aumentamos a probabilidade de sermos felizes e bem-sucedidos. Quando conhecemos o próprio corpo, podemos reconhecer por intermédio dos sinais o desequilíbrio e o quanto antes buscar o tratamento adequado.

Não apenas no TB, mas em qualquer outra doença, cabe ao paciente ter participação ativa, responsabilidade e consciência sobre a administração e manejo da enfermidade. Aos familiares, cabe o apoio e solidariedade, e ao profissional de saúde, cabe o dever de cuidar, esclarecer e informar o paciente e os familiares.

Autor:

Antonio Egidio Nardi – Membro Titular da Academia Nacional de Medicina

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