“O ideal é 100 doadores de órgãos por milhão de habitante. Se hoje temos 210 milhões de habitantes, precisaríamos de 21 mil óbitos por morte encefálica. Em 2019, foram 11.409 mil, causando um déficit de 9.606 mil órgãos para o número ideal,” disse a médica Arlene Badoch, coordenadora do Sistema Nacional de Transplante.
A necessidade de uma equipe bem capacitada para identificar possíveis doadores e disponível para auxiliar na segurança e suporte à família do doador é fundamental, salientou Badoch: “o não da família é sempre a falta de amparo de uma equipe não preparada”. A rede de doação precisa ser sólida para que as filas por doadores caiam. O Brasil é referência em transplante de órgãos. O Sistema Único de Saúde (SUS) é o nosso orgulho. Mas hoje a maior preocupação é com a rede de doação porque o transplante só ocorre se tivermos doadores.
A Academia Nacional de Medicina e o Cremerj discutiram o tema captação e transplantes de órgãos no Brasil em simpósio realizado no dia 21 de setembro. A sessão contou com abertura do presidente da ANM, acadêmico Rubens Belfort Jr, e Dr. Walter Palis Ventura, presidente do Cremerj, e a coordenação foi liderada pelos acadêmicos José de Jesus Camargo e Rossano Fiorelli; e pelos professores Joaquim Ribeiro, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, e Ricardo Ribas, da PUC-Rio, ambos também do Cremerj.
O médico Alexandre Cauduro, coordenador do Programa Estadual de Transplantes, salientou que a pandemia de covid-19 foi um empecilho para que as filas de transplantes pudessem diminuir. Segundo dados de Francisco Bandeira, Hospital dos Olhos de São Gonçalo, “houve uma deficiência de 40% nos transplantes de córnea, pois não se sabia como ocorria a contaminação pelo novo coronavírus, com isso as filas estão ainda maiores.”
Nos EUA, a pandemia também impactou nas filas de transplante que vinham em crescente desde 2012, batendo recorde em 2019. No ano seguinte, foram realizadas 721 cirurgias em hospitais públicos, segundo dados do médico Rodrigo Viana, diretor do Instituto de Transplante de Miami, que completou: “nos últimos 22 transplantes realizados não houve nenhum caso de óbito.”
Segundo o cirurgião Tiago Machuca, da Universidade da Flórida, 36 transplantes pulmonares foram realizados na Flórida em decorrência das sequelas provocadas pela covid-19, no último ano. “Após a cirurgia, os pacientes ainda precisam permanecer na ventilação mecânica por duas semanas e a alta só vem após 45 dias.”
O acadêmico José Jesus Camargo levantou questões acerca dos transplantes pulmonares com doadores vivos e explicou que para cirurgias pediátricas com órgãos de adultos alguns pontos precisam ser observados: que a doação ocorra como doador familiar; os cuidados com possíveis impedimentos genéticos; e a avaliação entre a estatura da criança e o tamanho do órgão.
“Quando é feita uma cirurgia pediátrica com o pulmão de um adulto, foi possível observar que o pulmão se desenvolve junto com a criança. Em um caso de sucesso, após 22 anos de acompanhamento, o pulmão tinha se desenvolvido e sem anormalidades” – disse acadêmico Camargo.
Entre as conclusões do simpósio, foram destaques, além da pandemia, que dificultou as filas de transplantes, tornando-as mais lentas tanto no Brasil como no mundo; não ter uma equipe bem preparada para uma abordagem correta aos familiares de possíveis doadores. Isso pode prejudicar os pacientes que se encontram nas filas. Afinal, como disse o cirurgião Alexandre Caudura: “o transplante é a ponta da cura de uma doença”. Para acessar o debate na íntegra, o link do simpósio é https://www.anm.org.br/simposio-de-captacao-e-transplante-de-orgaos-anm-cremerj-21-de-setembro-de-2021-parte-i/.