A gravidez deveria ser sempre uma festa! A vinda de mais um membro da família faz com que os casais se preparem intensamente durante os 9 meses para receber o novo rebento.
“Alegria, felicidade, abraços e festa na família.”
Todavia, por vezes, alguma coisa dá errado. Em cerca de 1 em cada 200 grávidas, o bebê não se forma corretamente e ao invés de gerar uma gravidez normal, há a formação apenas da placenta anormal, caracterizando a chamada gravidez molar. Pelo geral, as mulheres com essa doença apresentam sangramento na gestação, a barriga cresce mais do que o esperado, os vômitos são mais intensos e a pressão arterial fica alta desde o início da gravidez. A ultrassonografia faz o diagnóstico dessa doença em 90% das vezes e imediatamente devem essas pacientes ser encaminhadas para os Centros de Referência (no Estado do Rio de Janeiro, o Centro de Referência funciona na Maternidade Escola da UFRJ e no Hospital Universitário Antonio Pedro da UFF, para ver relação dos Centros de Referência de outros Estados, acesse www.trofos.org.br).
“Medo, preocupação e alerta.”
Ao chegar no Centro de Referência, essas pacientes são submetidas a uma cirurgia para retirar essa placenta de dentro do útero (uma curetagem mais moderna, feita por vácuo-aspiração). Tem alta com 24-48h do procedimento, voltando para sua casa. Todavia, em algumas dessas pacientes, a gravidez molar vai evoluir para o câncer da placenta, chamado neoplasia trofoblástica gestacional, e a paciente vai precisar de quimioterapia para não morrer.
“Perplexidade, perda do chão, tristeza…”
Para saber que vai se curar espontaneamente ou se vai precisar de quimioterapia para sobreviver, essas mulheres vão toda semana ao Centro de Referência para dosar um hormônio no sangue chamado gonadotrofina coriônica humana, o hCG. Nessa pesada rotina de consultas médicas, as pacientes vão encontrando outras mulheres que foram acometidas pela mesma doença e que estão passando pelas mesmas dificuldades que eles.
“Ufa, menos mal, pelo menos não sou só eu…”
A ansiedade toma conta delas, pois elas sabem que se o hormônio subir, elas deverão começar a quimioterapia.
“Na noite anterior nem consigo dormir direito”. “Meu parceiro não está aguentando”. “Meu trabalho está reclamando das faltas”, “E ai doutor, quanto deu o hormônio???”
Felizmente, para a grande maioria das pacientes o hCG cai, semana após semana…
“Que bom… Está caindo!!!”
Mas para 20% o hCG não cai e começa a subir…
“Nova tristeza, medo de morrer”. “Estou com câncer, e agora?” “Tenho filhos para criar…”
É aí que entra a importância da conscientização de que o câncer da placenta tem CURA!!!! Vamos começar a quimioterapia!
“Ah!!!!” “Meu cabelo vai cair?”
Não na quimioterapia de primeira linha, usada por mais de 80% das pacientes!
“Vou vomitar e ficar mal?”
Não na quimioterapia de primeira linha, usada por mais de 80% das pacientes!
“Vou morrer?”
Um dia, igual a todo mundo… Mas a mulher que trata sua neoplasia trofoblástica gestacional em Centros de Referência, descobre inicialmente sua doença, não falta as consultas e faz o tratamento adequado, tem 99% de cura!!!!
“Depois de curada doutor, vou poder engravidar de novo?”
Sim, se assim o desejar!
“E nessa gravidez tem chance da mola voltar?”
Sim, cerca de 1%. Por isso, em uma nova gravidez, você deve procurar o Centro de Referência de Doença Trofoblástica para receber orientação sobre essa nova gravidez.
“Quanto tempo devo esperar para engravidar de novo?”
Somente engravide após a alta do seguimento pós-molar. Pelo geral, se você não fez quimioterapia, você pode engravidar 6 meses após a primeira dosagem de hCG menor que 5 mUI/mL. Se você fez quimioterapia, você só deve engravidar após 12 meses da última sessão de quimioterapia.
“Doutor, durante o tratamento eu me sinto triste, abatida, sem ânimo, sem vontade de viver…” “As coisas com o meu marido não vão bem…” “Vejo todas as mulheres na minha rua grávida e eu aqui tratando essa mola…” “O que eu fiz para merecer isso???”
Não é fácil mesmo… Por isso nossas mulheres com gravidez molar precisam de ajuda. Esse artigo serve para mostrar para a sociedade essa doença quase invisível, mas que acomete milhares de mulheres brasileiras todos os anos, algumas acabam morrendo por falta de tratamento adequado.
Nossas mulheres grávidas, momento mais belo de suas vidas, merecem todo o cuidado em sua gestação. Se algo estiver errado, o obstetra deve atuar prontamente para minimizar os danos. Qualquer mulher com gravidez molar deve ser tratada em Centros de Referência a fim de recuperar sua saúde, mantendo sua função reprodutiva para poder ter lindos filhos quando essa tempestade passar.
E a tempestade passa… E dias de sol virão!!!
Autores:
Antonio Braga – Professor de Obstetrícia da UFRJ e da UFF, Pós-Doutor pela Universidade de Harvard e pelo Imperial College of London Mestre, Doutor e Pós-Doutor em Obstetrícia pela UNESP, Diretor do Centro de Doenças Trofoblásticas do Rio de Janeiro, Maternidade Escola da UFRJ, Hospital Universitário Antonio Pedro da UFF.
Carlos Antonio Barbosa Montenegro – Membro Emérito da Academia Nacional de Medicina