A história de uma mulher de 38 anos, que há 10 convive com a sentença de um diagnóstico de câncer de mama metastático foi relato do simpósio sobre paciente frágil, organizado pela Academia Nacional de Medicina, no dia 28 de outubro de 2021.
Jornalista e ativista em prol dos cuidados paliativos e da humanização na medicina, Ana Michelle Soares brindou a todos com um depoimento emocionante e falou sobre as dores e os sofrimentos que extrapolam os limites biológicos de viver uma doença fatal.
“Meu milagre de estar viva até hoje foi ter conhecido a medicina humanizada que olhou pra mim, não só através das imagens dos meus órgãos, do tamanho e da quantidade do câncer que eu tenho no meu corpo, mas tentou olhar pra mim como uma totalidade, pois eu não sou só os meus órgãos”.
A ativista contou que, por meio do seu projeto Casas Paliativas, luta para que os pacientes nessa condição sejam vistos de forma completa e com dignidade. “O tratamento a esses pacientes deve levar em consideração aspectos emocionais, sociais, espirituais e familiares. As pessoas que estão vivendo a vulnerabilidade de um diagnóstico terminal sentem dores além do câncer, sentem dores existências”, pontuou a jornalista.
Na bancada virtual e liderando o papel de comentarista da sessão ordinária, o acadêmico José de Jesus Camargo fez ponderações relevantes sobre o despreparo dos médicos para lidar com a finitude. “O médico, em geral, foge não só da morte, mas da notícia ruim da morte. A formação médica atual é omissa sobre esse convívio. Nós, médicos, fomos condicionados ao sucesso, nós adoramos dar notícias boas e cerca de 80% dos nossos atendimentos envolvem um discurso otimista. Isso explica por que a maioria dos médicos não sabe o que falar para um paciente terminal.”
Para Camargo o cuidado ao paciente terminal deve ser estendido à família que, segunde ele, adoece junto e de forma intensa. O acadêmico conta que em suas aulas reflete sobre relacionamento médico-paciente, tema que não consta na grade curricular das faculdades de medicina. “O médico precisa aprender que o paciente não é apenas a sua saúde, mas também a qualidade e dignidade da sua morte”.
O aumento na população de idosos é uma realidade desde o século XX, segundo dados apresentados por Fábio Neves, membro do Programa Jovem Liderança Médica da ANM e médico do Hospital Federal de Ipanema. Neves ressaltou que se estima que em 2.100 existam 61 vezes mais idosos do que nos tempos atuais. Para a medicina, isso representa um cenário crescente de pacientes frágeis. “O conceito para que idosos sejam considerados pacientes frágeis são segmentados a partir de: condição socioeconômicas desfavoráveis, debilidades físicas e cognitivas, maiores e mais prolongados cuidados devido ao avanço da idade” – conceituou Neves.
Esses pacientes têm maior probabilidade de internações prolongadas, com uma maior facilidade de evoluírem para quadros mais graves do que os mais jovens. O acadêmico José Galvão-Alves reiterou que o envelhecimento diminui a capacidade funcional dos órgãos, aumenta a chance de comorbidades e aumenta a fragilidade. “A reserva física cai a um nível crítico, a ponto de pequenos estresses se transformarem em sérios problemas de saúde, assim como a falta de autonomia e incapacidade.” – complementou Neves.
Por isso, uma equipe preparada é fundamental para que o paciente seja tratado de forma correta. Existem vários fatores de risco que podem ajudar a identificar um paciente frágil como declínio funcional, desnutrição e as comorbidades. Para o Galvão-Alves “entender o grau de vulnerabilidade de cada caso é importante para não tratar a doença e esquecer o homem. É necessário observar a realidade do paciente, durante o diagnóstico, além de suas condições como enfermo. Uma equipe de saúde deve ter em sua conduta acolhimento, envolvimento e mobilidade, lembrando que acolhimento e envolvimento são coisas diferentes.”
O acadêmico Octávio Vaz, um dos organizadores do evento, abordou os principais erros e acertos no tratamento cirúrgico do paciente frágil e declarou: “esses pacientes sempre devem contar com uma equipe multidisciplinar. Uma avaliação ou diagnóstico errado, a escolha inadequada do método a ser usado na cirurgia e um pós-operatório conturbado podem atrapalhar a recuperação”
Convidado do simpósio, o médico Fábio Miranda, da Rede D’Or São Luiz, expôs alguns pontos importantes de alerta: “não devemos menosprezar os possíveis sinais de complicações. Devemos procurar diminuir o risco cirúrgico, quando possível. Em geral, as complicações pós-operatórias no paciente frágil não são exclusivas, mas mais frequentes! Observe, examine e raciocine – muito ajuda quem pouco atrapalha.”
Como esses pacientes são delicados e merecem uma atenção mais direcionada, uma equipe médica preparada e atenta aos sinais é parte importante para o sucesso da recuperação desse paciente frágil.
A íntegra dessa sessão instigante está disponível em vídeo no canal da ANM no YouTube, em: