Na última quinta-feira (1), a Academia Nacional de Medicina realizou sua primeira Sessão Ordinária do ano de 2018. O Presidente da ANM, Acadêmico Jorge Alberto Costa e Silva, abriu os trabalhos da Sessão convidando os confrades Acadêmicos Adolpho Hoirisch e Antonio Egidio Nardi, co-organizadores do evento, para tomarem assento à mesa junto ao ex-Presidente Pietro Novellino. A Sessão contou com palestras sobre estimulação magnética transcraniana e neuromodulação no tratamento de transtornos como depressão, ansiedade e bipolaridade.
A Neuromodulação é um tratamento médico que consiste na aplicação de um campo eletromagnético visando modificar e modular o Sistema Nervoso Central ou Periférico, inibindo ou estimulando os neurotransmissores responsáveis por determinada função ou comportamento.
A Professora do Instituto de Psiquiatria da UFRJ, Tathiana Baczynski, abordou a utilização do método em tratamento de transtornos de ansiedade, pânico e estresse pós-traumático. Segundo a psiquiatra, a Estimulação Magnética Transcraniana (EMT) é a técnica indicada para este tipo de patologia. Esta técnica não-invasiva gera um campo magnético através de uma corrente repetitiva que equilibra determinada região do cérebro, delimitada previamente pelo médico.
Explicou ainda que os tipos de estímulo podem variar em velocidade, frequência, intensidade, intervalo e duração da série, dependendo das especificidades de cada caso. A médica do Laboratório de Pânico e Respiração do IPUB apresentou dados da utilização do tratamento em casos clínicos e concluiu que apesar de não existirem estudos suficientes para comprovar a eficácia da técnica, existem casos promissores que carecem de um maior investimento em pesquisa.
Também palestrando sobre EMT, a Dra. Patrícia Ciminelli (Hospital Universitário Clementino Fraga Filho) abordou o tratamento do zumbido, sintoma que acomete 15% da população, podendo variar entre leve, severo e incapacitante. A relação do zumbido com a plasticidade cerebral se dá através das alterações plásticas no sistema nervoso central e conexões anormais entre as vias auditivas e não-auditivas.
A Professora da UFRJ apresentou pesquisas acadêmicas e casos clínicos para demonstrar a eficácia do tratamento. Por conta do baixo número de amostras, observa-se um benefício parcial e temporário através do EMT de baixa frequência. Entretanto, ressaltou a importância do desenvolvimento de protocolos de estudo, principalmente por se tratar de uma fisiopatologia não totalmente esclarecida. Afirmou que existe otimismo em relação à neuromodulação, mas que não existe tratamento eficaz até o momento.
Outro tipo de Neuromodulação abordado foi a Estimulação Transcraniana de Corrente Contínua (ETCC), que estimula o cérebro através de um campo magnético gerado por um aparelho pequeno, não-invasivo e indolor. O Pesquisador Sérgio Machado, do Laboratório de Pânico e Respiração do IPUB/UFRJ, palestrou sobre o uso da técnica no tratamento da depressão.
Iniciou sua apresentação ressaltando que a depressão é um distúrbio mental que afeta uma em cada dez pessoas em todo o mundo – no Brasil, 80 milhões de brasileiros são afastados do trabalho por conta da doença. Apesar de muitos pacientes responderem bem aos tratamentos psicoterapêuticos e medicamentosos, 20 a 30% deles não respondem bem a nenhum tipo de tratamento, e para estes casos a ETCC é uma opção terapêutica a ser considerada.
Discorreu sobre os estudos já existentes a respeito deste tratamento, que apontam para a redução significativa dos sintomas. Concluiu então que o método é promissor, mas serão necessários estudos com seguimentos de média e longa duração para que haja confirmação efetiva.
Em seguida, o doutor do Instituto de Psiquiatra da USP, Izio Klein versou sobre a Neuromodulação no tratamento de transtorno bipolar, apresentando estudos realizados em pacientes de depressão unipolar e pacientes bipolares, utilizando o método de Estimulação Magnética Transcraniana Repetitiva Inibitória (EMTR) para o primeiro e Estimulação Transcraniana de Corrente Contínua (ETCC) para o segundo. A EMTR apresentou resultados significativos nos dois tipos de pacientes, enquanto a ETCC apresentou benefícios no tratamento de episódios depressivos dentro do transtorno bipolar.
Ao concluir sua apresentação, Izio Klein alertou que a neuromodulação não pretende substituir medicações e métodos convencionais; entretanto, apresenta poucos efeitos colaterais, custo reduzido em relação a procedimentos mais invasivos e há grande possibilidade de benefícios, principalmente em conjunto com medicações convencionais e outros tratamentos oferecidos.
O Dr. Leandro Valiengo, do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, discutiu o uso da neuromodulação no tratamento de esquizofrenia, transtorno que afeta 1% da população. A esquizofrenia apresenta uma variedade de sintomas, que podem ser classificados em positivos e negativos. Enquadrados no primeiro grupo estão, delírios, alucinações, comportamentos ou discursos desorganizados. Entre os sintomas negativos: expressão emocional diminuída, ausência ou diminuição de iniciativa, alogia e anedonia, uma situação clínica que dispõe de poucos tratamentos.
Diante dos estudos e casos clínicos apresentados, observou-se que em pacientes que apresentam sintomas negativos são necessárias pelo menos 15 sessões de estimulação, seja por EMT ou ETCC. Já entre os sintomas positivos, os estudos focam principalmente no tratamento da alucinação auditiva, já que este tipo de alucinação oferece uma maior possibilidade de descobrimento de sua neurobiologia. Nestes casos, o efeito da estimulação transcraniana não persiste por um longo período após o término do tratamento, por isso se indica a realização de sessões continuadas, para evitar a recaída de sintomas.
Na segunda etapa do simpósio, a discussão sobre transtornos mentais expandiu-se para uma abordagem mais abrangente a respeito da mente e do cérebro no século 21. O Acadêmico Antonio Egidio Nardi abordou a neurogênese, a formação de novos neurônios no cérebro adulto. O conceito é recente, surgiu no final do século passado, em 1999, com a descoberta das primeiras células tronco em humanos adultos. Em 2007, estudos que demonstravam não apenas a formação de novos neurônios, mas sua migração e formação de sinapses foram um marco para a neurociência.
Em estudo realizado pelo Acadêmico no Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho, ficou comprovado que dietas hipercalóricas prejudicam a função cerebral, enquanto dietas hiperproteicas e hipocalóricas, com períodos intermitentes de jejum melhoram sua função. Outros estudos revelam também que o consumo de resveratrol, presente principalmente em alimentos da cor vermelha, auxiliam na formação de novos neurônios.
Para finalizar sua apresentação, o psiquiatra indicou atividades que estimulam a neurogênese, como exercício físico, por exemplo, e outras que diminuem o potencial da atividade cerebral, estresse, privação de sono e consumo de drogas. O Acadêmico concluiu que o que piora a neurogênese também torna o indivíduo mais suscetível a transtornos mentais como depressão e ansiedade.
O Presidente Jorge Alberto Costa e Silva fechou o simpósio com palestra sobre mente e consciência humana, trazendo questões sobre a relação entre cérebro, mente e consciência e como isto se dá do ponto de vista filosófico, através da dualidade materialismo e idealismo, e da física quântica.
Segundo o Acadêmico, a ciência foi construída para explicar o mundo da matéria, até o átomo numa concepção newtoniana. A partir dos estudos sobre substancias elementares e subatômicas, questionamentos sobre o funcionamento da consciência emergiram e até hoje não são explicados.
Em seu discurso, o Presidente procurou levantar uma reflexão a respeito do modelo de ciência atual, e o papel da ciência e da medicina enquanto fatores de evolução para o mundo. Finalizou o evento agradecendo aos Acadêmicos e expositores que trouxeram questões pertinentes para o futuro da ciência.