ANM relembra os 30 anos do Acidente de Goiânia com Simpósio

28/09/2017

Em 2017 completa-se 30 anos daquele que é considerado pela a Agência Internacional de Energia Atômica (IAEA) como o maior acidente radiológico do mundo, dada a extensão da contaminação. Ocorrido em Goiânia em 1987, o acidente decorreu em aproximadamente 249 casos com significativa contaminação e quatro mortes oficiais, incluindo a menina Leide das Neves, com 6 anos na época do acidente.

O incidente teve início após jovens catadores de papel encontrarem um aparelho de radioterapia desativado, contendo o elemento radioativo. A peça foi achada em um prédio do antigo Instituto Goiano de Radioterapia e foi em seguida desmontado e repassado a terceiros, resultando no rastro de contaminação.

Fazendo alusão à chamada meia-vida – tempo necessário para que metade dos átomos presentes em uma amostra radioativa desintegre-se – do elemento Césio, a Academia Nacional de Medicina organizou o Simpósio “Uma Meia Vida Depois – O Acidente de Goiânia”, para relembrar este trágico e importante evento da história mundial, apresentando também o estado atual dos estudos desenvolvidos sobre a radiação e seus efeitos na saúde humana. O evento foi coordenado pelos Acadêmicos José Galvão-Alves e Carlos Eduardo Brandão. Além dos Acadêmicos, participaram da organização os Drs. Claudio Tinoco (UFF), Anderson Oliveira (CNEN), Paulo H. Rosado de Castro (UFRJ) e Sérgio Altino (SBMN).

Na mesa Diretora do Simpósio, o Presidente Jorge Alberto Costa e Silva junto ao Acadêmico Carlos Eduardo Brandão e os Drs. Alexandre Rodrigues Oliveira e Paulo Heilbron Filho

Mas nem só de malefícios vive a radiação. Em sua apresentação, o Dr. Claudio Tinoco exaltou os avanços do uso desta técnica em prol da saúde humana. A importância dos usos da radiação na Medicina foi ressaltada, levando-se em consideração suas aplicações tanto no diagnóstico quanto na terapia. A respeito do uso da Medicina Nuclear no Sistema Único de Saúde, Claudio Tinoco declarou que esta é subutilizada, salientando que o desenvolvimento de um plano coordenado interministerial e com apoio da Sociedade Civil Organizada precisa ser empreendido para mudança desta realidade.

Apesar de todos os benefícios envolvidos, a utilização de quaisquer práticas que envolvam o uso de energia nuclear encontra como grande entrave a opinião pública, afetada pelo estigma gerado a partir de eventos traumáticos como as bombas de Hiroshima e Nagasaki. A respeito dos principais aspectos da chamada Proteção Radiológica, o Dr. Paulo Heilbron Filho (CNEN) ressaltou que o Sistema de Proteção Radiológica está baseado nas três grandes Teorias da Ética, combinando o respeito aos direitos individuais, a busca do interesse coletivo e o agir com justiça. Desta forma, destacam-se: o da justificação, o da optimização da proteção e o da aplicação dos limites de dose, de forma a reverter esse quadro de estigma e permitir que a sociedade se beneficie das inúmeras vantagens que a tecnologia nuclear oferece.

Os Acadêmicos Carlos Eduardo Brandão e Daniel Tabak (ao centro) junto aos convidados que participaram do atendimento às vítimas

Já ao Dr. Alexandre Oliveira coube discorrer sobre a Abordagem Clínica das Radiolesões, tendo como foco o atendimento às vítimas do acidente em Goiânia. Segundo o médico, o atendimento envolveu algumas particularidades como o fato de afetar um centro urbano (em oposição ao acidente com a usina em Chernobyl), a forte relação social e familiar das vítimas e o fato de que o planejamento de emergência não contemplava o tipo nem a localização do acidente. Ressaltou, ainda, a intensa mobilização de recursos humanos e materiais desprendidos para a abordagem do evento, sem precedentes na história do país. Em suas considerações finais, salientou que as lesões radioinduzidas tem um curso longo e são sujeitas a recidivas, em geral, severas. Além deste fato, estas lesões possuem caráter crônico-degenerativo, fazendo-se necessário o acompanhamento a longo prazo.

Considerada a causa da morte de vítimas como a menina Leide das Neves, a Síndrome da Radiação Aguda foi abordada pelo o Acadêmico Carlos Eduardo Brandão, que a classificou como um conjunto de sintomas e sinais clínicos consequente à exposição a materiais radioativos. Chamou atenção para o fato de que esta é uma síndrome caracterizada por distúrbios que se refletem em praticamente todos os sistemas do organismo, dependendo da dose absorvida, da taxa e da forma de exposição. Os sintomas podem incluir alterações gastrointestinais, queda de cabelo, sintomas neurológicos e distúrbios do comportamento, dentre outros. Destacou que, de forma geral, a gravidade do quadro pode ser medida de acordo com o intervalo de tempo entre a exposição e o início do quadro clínico, chamando atenção para o fato de que, em Goiânia, este intervalo foi especialmente curto (alguns pacientes já apresentavam sintomas no mesmo dia da exposição ao Césio).

Sobre as lições aprendidas após o acidente, o Dr. Rex Nazaré, que era Presidente da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) em 1987, apresentou uma linha do tempo do acidente, discorrendo sobre as medidas tomadas pelas autoridades da época, fazendo uma avaliação acerca de cada um dos aspectos abordados. Um dos mais importantes, segundo o físico, foi a execução de um comando centralizado, dada a extensão do acidente e a necessidade de uma ação rápida e eficiente. Também destacou a importância do desenvolvimento de medidas de segurança e da existência de uma infraestrutura adequada para o atendimento das vítimas. Por fim, considerou indispensável o acompanhamento dos efeitos psicológicos, sociais e econômicos de um evento desta magnitude, que, mais de 30 anos depois de seu vórtex, ainda tem consequências significativas na vida daquela população.

O Dr. Claudio Tinoco, o Dr. Juliano Cerci (Presidente da Sociedade Brasileira de Medicina Nuclear, SBMN), os Acadêmicos Hiram Silveira e Jorge Alberto Costa e Silva e o Dr. Paulo Henrique Rosado de Castro (Programa Jovens Lideranças Médicas)

O Simpósio também contou com um momento dedicado a homenagear as instituições envolvidas no atendimento às vítimas de Goiânia, além do Dr. Rex Nazaré, que teve participação direta e ativa na condução das atividades. Foram homenageados o Hospital Naval Marcílio Dias, a companhia Eletronuclear, o Exército, a Aeronáutica e o Corpo de Bombeiros do Rio de Janeiro. O Simpósio foi encerrado com uma importante rodada de discussões da qual foram convidados a participar especialistas e autoridades de diversas instituições como a Sociedade Brasileira de Medicina Nuclear, o Colégio Brasileiro de Radiologia e Diagnóstico por Imagem e a Sociedade Brasileira de Radioterapia.

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