Na última quinta-feira (20/10), a Academia Nacional de Medicina (ANM) e a Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Rio de Janeiro (FAPERJ) promoveram um evento para celebrar o bicentenário da Independência e o centenário da Semana de Arte Moderna no país. O simpósio faz parte do projeto Bicentenário da Independência: 200 anos da Medicina no Brasil, coordenado pelo Presidente Acadêmico Francisco Sampaio que visa à organização de um Simpósio o qual aborda três vertentes da medicina (Clínica Médica, Cirurgia e Ciências Básicas), uma exposição no Centro da Memória Médica (CMM) sobre os 200 anos de evolução da medicina no Brasil e a confecção de um livro onde através de uma análise crítica sobre o desenvolvimento da medicina no país entre 1822 a 2022.
A programação do evento foi elaborada a partir dos capítulos que estão sendo desenvolvidos para o livro. Esta obra inédita tem sua previsão de lançamento para o primeiro semestre de 2023 e estará disponível gratuitamente no site da ANM. Em novembro será inaugurada a nova exposição do CMM 200 anos de Medicina no Brasil, que trará documentos e peças do acervo institucional para abordar o desenvolvimento da teoria e prática médica, abordando desafios e as perspectivas.
Foram 10 apresentações no total que transpassaram os temas mais importantes desses 200 anos. O Acadêmico Carlos Alberto Basílio de Oliveira abriu a tarde com a palestra “A Medicina da Colônia ao Império”. Foi explicado que o primeiro médico do Brasil foi João Menelau, que veio acompanhando Pedro Álvares Cabral, e de como o surto de febre amarela foi o principal catalisador para a vinda de profissionais ao país. Outra grande influência para medicina e saúde das colônias eram os Pajés das tribos indígenas, aumentando o foco na medicina não tradicional e erudita. O Acad. Basílio de Oliveira ressaltou que a profissão foi regularizada no país apenas no período regencial.
Se falarmos de medicina no Brasil, a ANM é peça fundamental. Esse foi o foco da apresentação seguinte, “Da Sociedade de Medicina do Rio de Janeiro à ANM”, ministrado pelo Acadêmico Omar da Rosa Santos. Ele discorreu sobre a importância da fundação da Academia no contexto Imperial, identificando esta como um produto da independência do país. Sendo a instituição científica-cultural mais antiga em exercício no Brasil, o Acadêmico descreveu as primeiras reuniões e sessões ordinárias, evidenciando o desejo dos fundadores em melhorar as condições sanitárias e a qualidade de vida da população. O Acad. Omar ainda elucidou sobre a evolução dos processos e da tradição existente na academia até os dias atuais.
Dando continuidade ao simpósio, o Acadêmico José Luiz Gomes do Amaral apresentou um tema relevante dentro da Academia, “O Ensino Médico Brasileiro”, no qual abordou o início do estudo da medicina no país, e seu desenvolvimento até o novo século. Com a chegada da corte real portuguesa ao porto da Bahia, D. João VI funda a primeira faculdade de medicina do país, desde então, o ensino médico sofreu alterações em sua grade curricular e teve um crescimento em todo o país. O Acad. José Luiz Gomes do Amaral afirma que durante os anos 80 e 90, do século XX, o número de médicos era desproporcional à população, contudo, já no século XXI houve um avanço nesse número, que expandiu tendo hoje temos mais 330 escolas médicas no Brasil. Atualmente o país encontra-se em segundo lugar no ranking mundial, que tem a Índia como o primeiro lugar. Destaca-se que a diferença entre os colocados é cerca de um bilhão de habitantes, contudo, problematiza o tipo de ensino ofertado a partir do elevado número de instituições.
O Acadêmico apontou em sua palestra sobre como as instituições particulares se tornaram um negócio lucrativo aos empresários por terem grande número de vagas disponíveis e interesse popular. Com o aumento do número de egressos nestas universidades e faculdades, o Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo aplicou, por alguns anos, uma prova não obrigatória para testar os conhecimentos, entretanto, este processo caiu em desuso.
Os avanços médicos no campo da pesquisa e prática médica podem ser encontrados ao longos dos séculos, contudo, o Acadêmico Cláudio Tadeu Daniel-Ribeiro destacou em sua palestra intitulada A Medicina Experimental do Século XX, sobre os grandes cientistas que lideraram o progresso do país. Sendo assim, evidenciou através das biografias dos Acadêmicos Oswaldo Cruz e Carlos Chagas o desenvolvimento científico, como o avanço da patologia moderna e dos experimentos que proporcionaram descobertas únicas, como a doença de Chagas.
Ainda na primeira parte do simpósio, o Acadêmico Giovanni Cerri apresentou o tema “As Guerras e o Desenvolvimento Científico”, sobre como esses eventos históricos contribuíram para o desenvolvimento da medicina contemporânea. Durante os períodos de guerra vivenciados mundialmente, pode-se observar que a participação dos médicos frente ao combate resulta em aplicações que deixaram um legado no mundo e entre esses feitos, podemos citar: as ambulâncias, hospitais de campanha, tratamento de feridas, a fundação da Cruz Vermelha, a criação da enfermagem moderna, sistema de rondas, descoberta e uso da penicilina, aprimoramento de novas técnicas cirúrgicas, implementação da anestesia, utilização do raio x e até mesmo o desenvolvimento da cirurgia plástica.
Com um tema em debate na atualidade, o Acadêmico Carlos Gottschall discorreu sobre Epidemias e Pandemias dos séculos XX e XXI. Inicialmente, explicou a diferença entre os termos epidemia e pandemia, para então destacar as principais infecções contemporâneas: gripe espanhola e a Covid-19. Numa perspectiva brasileira, o Acad. Carlos Gottschall falou sobre a criação da medicina sanitarista, realizada por conta das condições higiênicas do país. Como resultado, no início do século XX iniciou-se a revolta da vacina, movimento marcado pela insatisfação popular com as ações promovidas pela nova república. Ele finalizou sua apresentação afirmando que a cada século ocorre o surgimento da uma ou duas novas pandemias e epidemias.
Finalizando a primeira parte do simpósio, a Acadêmica Talita Franco apresentou A Presença Feminina na ANM, tema de suma importância na contemporaneidade, afirmando que o principal problema está na formação das mulheres no ensino médico, que era proibido até o final do século XIX e ressoa até hoje na falta de igualdade de gênero. A Acadêmica conta a história de cada uma das nove mulheres que foram, e são, Membros Titulares nesses quase 200 anos de história da ANM. Além da Acad. Talita Franco, também fazem parte da instituição as Acadêmicas Madame Durocher, Lea Ferreira Camillo-Coura, Anna Lydia Pinho de Amaral, Anadil Vieira Roseli, Eliete Bouskela, Patricia Rocco, Mônica Gadelha e Margareth Dalcolmo.
Após o intervalo, as apresentações retornaram com o tema “As Santas Casas de Misericórdia”, ministrada pelo Acadêmico José Galvão-Alves, expondo a criação das irmandades no país desde o século XVI, ainda em Portugal, e como ela foi estabelecida no Brasil. Ele explicou sobre a etimologia da palavra misericórdia e conta quais são os principais dogmas religiosos e qual sua importância desta para a fundação dos hospitais públicos do país, destacando a Santa Casa da Misericórdia do Rio de Janeiro e a sua performance até a atualidade.
Em seguida, a apresentação foi sobre a “Semana de Arte Moderna: A Influência da Medicina na Arte Brasileira”, ministrada pelo Acadêmico Gilberto Schwartsmann. Ele explicou sobre o que foi a Semana de Arte Moderna e a missão dos artistas visando alcançar um estética mais livre e própria nacional no inicio do século XX. O Acad. Schwartsmann apresentou um contexto histórico da época no país, identificando como as transformações sociais impactavam a Arte. Assim pode-se identificar nas obras reflexos das condições de vida popular, sua relação com a escravidão e o povo liberto, as transformações da então capital, Rio de Janeiro, com a Reforma de Pereira Passos, bem como evidenciou física e culturalmente muitos Brasis dentro do Brasil.
A última palestra do simpósio foi sobre “O Sistema de Saúde Pública nos 200 anos” e foi apresentada pelo Ministro de Estado da Saúde Marcelo Queiroga. Iniciando a sua fala, destacou a importância da criação do Sistema Único de Saúde (SUS), um benefício fundamental para a população previsto na constituição de 1988, garantindo acesso à saúde para todos, e que esse é o principal meio de igualdade no país. O ministro ainda abordou a importância do SUS durante a pandemia, principalmente nos lugares mais afastados, como o interior do país. Ainda reforçou a necessidade de uma reforma no sistema de saúde, no público e privado, para que ele seja mais efetivo.
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