Academia Nacional de Medicina promove simpósio Zika & Chikungunya

22/09/2016

Consoante com o compromisso de promover debates de grande importância para a sociedade civil, a Academia Nacional de Medicina promoveu, na última quinta-feira (22), Simpósio sobre Zika vírus e Chikungunya. O Simpósio, organizado pelos Acadêmicos Rubens Belfort, Francisco Sampaio e Paulo Buss contou com a participação de especialistas de diversas áreas, em tarde que pautada pela multidisciplinaridade.

Plateia formada por estudantes, especialistas e profissionais da área de saúde no Anfiteatro Miguel Couto

Em apresentação intitulada “Diagnóstico Clínico – Dengue, Zika e Chikungunya”, o Acadêmico Celso Ramos ressaltou que o mosquito Aedes pode ser considerado o maior predador do homem, devido à sua capacidade de espalhar agentes patológicos a uma parcela cada vez maior da população. Nessa conjuntura, fenômenos como a globalização são considerados importantes agentes de disseminação.

O Acadêmico Celso Ramos falou sobre os aspectos clínicos das arboviroses

Sobre a Dengue, foi ressaltada sua distribuição mundial e o aumento progressivo da morbidade associada à doença. A febre Chikungunya, por outro lado, se desenvolveu a partir de uma série de grandes surtos na Ásia e África; todavia, é apenas após uma série de mutações que o vírus “invade” as Américas em 2013, dando origem ao quadro atual da doença. Por fim, chamou atenção para o fato de que, até 2007, só haviam sido relatados cerca de 14 casos associados ao Zika vírus, que, após também “invadir” as Américas em 2015, vem apresentando importantes desdobramentos, como a associação com a microcefalia e distúrbios neurológicos.

Discorrendo sobre “Diagnóstico Laboratorial”, o Prof. Mauricio Nogueira (FAMERP) deu maior destaque ao Zika vírus, chamando atenção para o alto grau de incerteza no diagnóstico, principalmente quando associado a infecções secundárias. Também apontou para o fato de que, antes do surto de microcefalia associado ao Zika vírus, o diagnóstico laboratorial não se constituía como uma prioridade para os agentes de saúde.

O Prof. Mauricio Nogueira em apresentação sobre diagnóstico laboratorial

No encerramento de sua conferência, o Prof. Mauricio Nogueira salientou que existe uma necessidade imperativa de métodos sorológicos confiáveis, uma vez que o quadro com o qual lidamos é de critérios clínico-epidemiológicos ainda não estabelecidos e questionáveis.

Em apresentação intitulada “Tratamento das Arboviroses”, o Prof. Rivaldo Venâncio da Cunha (Fiocruz – MS) deu ênfase à Dengue e Chikungunya. Sobre a primeira, ressaltou que ainda se constitui em uma ameaça à saúde pública no país, que, ainda em 2015, registra recordes de mortes decorrentes da doença. No que se refere à Chikungunya, o aspecto incapacitante da doença (em decorrência das fortes dores) foi apontado como gatilho para desdobramentos psicológicos, como a depressão. Além deste fato, o infectologista chamou atenção para a possibilidade de desdobramentos mais graves, incluindo envolvimento neurológico, insuficiência renal, hepatites, dentre outros.

Prof. Rivaldo Venâncio

Para o Prof. Rivaldo Venâncio, a ausência um tratamento capaz de curar a infecção e de vacinas voltadas para preveni-la demanda o emprego de uma estratégia realista de combate a estas patologias, com a compreensão de que estamos diante de um problema complexo, sobre o qual muito falta a se descobrir e se compreender.

Na sequência, o Prof. Rafael Maciel de Freitas (Fiocruz – RJ) apresentou “Vetores: Aedes e Culex”, destacando que a determinação dos vetores de uma infecção transmitida por inseto pode se dar em laboratório, por meio da detecção de partículas virais na saliva do mosquito ou em campo, por meio da captura de exemplares direto da natureza. A partir dessa determinação, o Prof. Rafael Maciel de Freitas apresentou estudos epidemiológicos associados à capacidade vetorial do Aedes aegypti, ou seja, a habilidade deste mosquito em transmitir diferentes patógenos.

O Prof. Rafael Maciel de Freitas abordou vetores das arboviroses

Em apresentação sobre “Síndrome Zika Vírus Congênita”, o Acadêmico Carlos Montenegro, apresentando os últimos estudos sobre a associação entre o Zika vírus e os casos de microcefalia, afirmou que, uma vez que a microcefalia não é a única comorbidade registrada nos casos de Zika vírus em gestantes, a nomenclatura utilizada atualmente é de “síndrome Zika vírus congênita”. Foram apresentadas as formas de diagnóstico disponíveis atualmente, como ultrassonografia cefálica (em gestantes) e a medida do perímetro cefálico (no recém-nascido).

O Acadêmico Carlos Montenegro em apresentação sobre Zika Vírus Congênita

O Acadêmico Montenegro defendeu a utilização do “algoritmo do Zika vírus”, que constitui um conjunto de medidas que visa proteger a saúde das gestantes e tornar mais eficaz a identificação dos casos de microcefalia. De acordo com esse algoritmo, em regiões onde há incidência de Zika vírus, a gestante, ainda que sem apresentação de sintomas, deverá manter uma rotina constante de ultrassonografias, a fim de indica quaisquer indícios da síndrome.

Discorrendo sobre “História Natural da Zika em Gestantes e Recém-Nascidos” a Profa. Maria Elizabeth Moreira (Instituto Fernandes Figueira), chamando atenção para o fato de que a Zika é a primeira doença congênita transmitida por um vetor. Em decorrência de uma frequente manifestação assintomática do Zika vírus, muitas mães aparentemente saudáveis são surpreendidas pela manifestação da síndrome congênita em seus filhos. Em seguida, apresentou as principais manifestações da síndrome, como polegar cortical, irritabilidade, hipertonia, excesso de pele no couro cabeludo, etc. Todavia, mesmo em casos em que não há apontamentos na ultrassonografia pré-natal e perímetro cefálico normal, portadores da síndrome congênita apresentam algum tipo de alteração neurológica.

A Profa. Maria Elizabeth Moreira

Abordando “Quadros Oftalmológicos na Infecção Congênita e Adquirida”, o Acadêmico Rubens Belfort afirmou que apesar das limitações advindas da não existência de um exame sorológico para diagnóstico definitivo de infecção congênita pelo Zika vírus, diversos estudos que identificaram a presença de disfunções neurológicas variadas também denunciaram a existência de lesões oculares. A microcefalia por si só pode ocasionar alteração do nervo óptico (hipoplasia); porém no caso da microcefalia causada pelo Zika vírus ocorrem outras alterações associadas, como pigmentação na região macular e atrofia coriorretiniana, que podem variar de extensão e severidade.

O Acadêmico Rubens Belfort discorreu sobre o quadro oftalmológico decorrente da infecção por zika vírus

Ao final de sua apresentação, o Acadêmico afirmou que existem ainda muitas lacunas no estudo dos desdobramentos da infecção do Zika vírus ainda a serem preenchidas, mas que o acompanhamento precoce, que é recomendação do Ministério da Saúde, se constitui na principal ferramenta para combater e reduzir os danos causados pelo rápido avanço da doença.

Em palestra denominada “Acolhida, Habilitação e Reabilitação das Crianças com Zika Congênita”, a Dra. Liana Ventura (Hospital dos Olhos – PE) chamou atenção para o fato de que, apesar de estarem sendo conduzido inúmeros estudos sobre o Zika vírus, ainda há desconhecimento no que se refere às suas especificidades. Outro fator considerado de grande importância é o fato de que o acolhimento também deve ser estendido às mães, que, devido à falta de informação e à precariedade da rede de atendimento convencional, se encontram em uma situação altamente estressante e frustrante.

A Dra. Liana Ventura em sua apresentação

Com uma experiência que se iniciou a partir do diagnóstico de anormalidades no nervo óptico e lesões na retina em recém-nascidos com microcefalia, o trabalho da Fundação Altino Ventura busca a adoção de conduta terapêutica específica para os casos de Zika vírus congênita. Firmando parceria com a Prefeitura do Recife, o convênio prevê o desenvolvimento de ações de saúde ocular, com diagnóstico e reabilitação.

Em palestra sobre “Perspectivas em Vacinas”, o Dr. Jorge Kalil (Instituto Butantan) afirmou que o desenvolvimento da vacina de vírus inativado contra Zika já está em desenvolvimento há alguns meses. O Professor afirmou que os pesquisadores do Instituto já trabalharam no processo de cultura, purificação e inativação do vírus em laboratório, além de trabalharem paralelamente no desenvolvimento de uma vacina a base de DNA, outra vacina com vírus inativado semelhante à vacina da dengue, além de uma vacina híbrida que tem como base a vacina de sarampo. O instituto também trabalha no desenvolvimento de um soro contra Zika e de anticorpos para combater o vírus, ambos com a função de neutralizar o vírus já presente no organismo da pessoa infectada.

Dr. Jorge Kalil falou sobre as perspectivas de vacinas

Ao final de sua apresentação, o Dr. Jorge Kalil afirmou que o Instituto deve ter uma fábrica dedicada à produção da vacina contra dengue até o final de 2016, equipada e preparada para a produção da vacina, desenvolvida em parceria entre o Butantan e os Institutos Nacionais de Saúde dos Estados Unidos (NIH).

A Dra. Fernanda Fialho (Instituto Estadual do Cérebro), em apresentação denominada “A Experiência do Instituto Estadual do Cérebro Paulo Niemeyer”, abordou o cronograma do atendimento a crianças com Zika vírus, que se desenvolve em diversas etapas – desde o acolhimento, a passagem por equipe multidisciplinar de pediatras, neuropediatras, fisioterapeutas, fonoaudiólogos e psicoterapeutas, até a formação de relatório completo sobre a condição de cada paciente, visando a formação de um atendimento personalizado, focado nas necessidades específicas de cada um.

A Dra. Fernanda Fialho falou sobre a experiência do Instituto Estadual do Cérebro no atendimento a crianças com Síndrome Zika Vírus Congênita

Levando em consideração o perfil socioeconômico das famílias atendidas – que é de baixa renda, a Professora finalizou sua palestra ressaltando que os relatórios gerados a partir destes atendimentos serão de grande importância para o melhor conhecimento da Síndrome e melhor gerenciamento da situação endêmica do Zika vírus.

Em seguida, o Acadêmico Paulo Buss fez apresentação sobre “A Causa das Causas. Determinantes sociais das Epidemias por Arbovírus”. Chamou atenção para o fato de que a análise socioeconômica das arboviroses é de extrema importância, uma vez que as doenças não são objetos de estudo exclusivamente médico – o infectologista afirmou se tratarem de “doenças sociais”. Segundo o Acadêmico, o reconhecimento das determinantes sociais levaria a respostas mais rápidas e adequadas do Sistema de Saúde frente a desafios como a recente epidemia de Zika e Chykungunya.

O Acadêmico Paulo Buss

Na conclusão de sua explanação, o Acadêmico Paulo Buss afirmou ser necessária uma ação combinada de políticas públicas e participação social na construção de um Sistema de Saúde que vá além de respostas puramente técnicas e médicas. A ação intersetorial (poderes público, privado e sociedade civil) é necessária ao combate das arboviroses, principalmente no Brasil, que possui inúmeras condições favoráveis à disseminação destas doenças.

Encerrando as atividades do Simpósio, o Dr. David Uip apresentou aula intitulada “Situação Epidemiológica Atual e Perspectivas”, enfatizando as ações no Estado de São Paulo, onde o governo estabeleceu um pacto junto às prefeituras municipais, visando assumir protagonismo no controle e combate das arboviroses. Além deste fato, foi montada força-tarefa para combater o Aedes aegypti, mosquito transmissor da dengue, da febre Chikungunya e do Zika vírus. O objetivo do trabalho é localizar e eliminar os criadouros, e faz parte do chamado Plano Estadual de Combate às Arboviroses.

O Prof. David Uip apresentou dados sobre a situação atual das epidemias de Zika e Chikungunya

A palestra foi finalizada com a apresentação das ações de combate de arboviroses para o 2º semestre de 2016, que incluem a organização de mutirões em parceria com a Defesa Civil do Estado; a remuneração extra para agentes municipais para atuarem nos finais de semana; a coleta de pneus em 300 municípios do Estado; o estabelecimento de parcerias com a iniciativa privada, ONGs e entidades de classe, além da mobilização para o Dia Nacional de Mobilização para o Combate

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