A Academia Nacional de Medicina sediou o II Encontro das Ligas Acadêmicas de Ginecologia e Obstetrícia do Rio de Janeiro

12/09/2016

No dia 02 de setembro de 2016, a Academia Nacional de Medicina sediou o II Encontro das Ligas Acadêmicas de Ginecologia e Obstetrícia do Rio de Janeiro. Dentre os palestrantes convidados estavam o Acad. Carlos Antonio B. Montenegro, a Prof. Dra. Denise Leite Maia Monteiro, a Prof. Dra. Valéria Moraes, o Prof. Dr. Raphael Câmara, a Prof. Dra. Michele Pedrosa, o Prof. Dr. Mário Giordano, o Prof. Dr. Renato Ferrari, a Prof. Dra. Yara Furtado, a Prof. Dra. Filomena Aste Silveira, a Prof. Dra. Susana Aidé, o Prof. Dr. Jorge Rezende Filho, o Prof. Dr. Guilherme de Jesús, o Prof. Dr. Antônio Braga, o Prof. Dr. Mario Vicente, a Prof. Dra. Regina Rocco e o Prof. Dr. Alexandre Trajano.

Salão lotado de jovens estudantes de Medicina

O Acadêmico da Academia Nacional de Medicina, Carlos Antonio B. Montenegro, foi o organizador e inaugurou o encontro falando sobre os seus estudos de atualização em pré-eclâmpsia – formas clínicas.

Acadêmico Emérito Montenegro com professores e alunos no II Encontro das Ligas de Ginecologia e Obstetrícia.

Segundo o Acadêmico, a Hipertensão gestacional – elevação da PA > 140/ 90 mmHg, SEM proteinúria, após 20 semanas da gravidez caracteriza uma pré-eclâmpsia, isto é, síndrome multissistêmica com hipertensão & proteinúria ≥ 300 mg/24 h, após 20 semanas. A eclâmpsia inclui a presença de convulsão em mulher com pré-eclâmpsia. Além disso, a hipertensão crônica – hipertensão pré-existente à gravidez ou antes de 20 semanas, e ainda presente decorridas 6-12 semanas do pós-parto. Já a pré-eclâmpsia superajuntada ocorre em mulheres com hipertensão crônica aparecimento de proteinúria, aumento subitâneo da proteinúria/hipertensão, já presentes no início da gravidez, desenvolvimento da síndrome HELLP ou de cefaleia/escotomas visuais/dor epigástrica.

A Síndrome HELLP é caracterizada por pré-eclâmpsia grave e acometimento hepático; sua incidência é de 20% das mulheres com pré-eclâmpsia grave.

Acadêmico Carlos Antonio B. Montenegro
Susana Aidé (Universidade Federal Fluminense – UFF) e Filomena Aste Silveira (Faculdade de Medicina de Valença)
Dra. Regina Rocco (Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ)

Em seguida, a Professora Dra. Denise Leite Maia Monteiro, Vice-Presidente da Região Sudeste da Associação Brasileira de Obstetrícia e Ginecologia da Infância e Adolescência (SOGIA-BR), Prof. Adjunta da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e Prof. Titular da Centro Universitário Serra dos Órgãos (UNIFESO), ministrou uma palestra sobre a prevalência da gravidez na adolescência no Brasil. Ela fez uma introdução sobre como na Idade da Pedra e na Idade Média era considerado ideal que meninas deixassem de menstruar e engravidassem o quanto antes. Nos dias de hoje, segundo ela, as redefinições das expectativas sociais depositadas nos jovens e a possibilidade de vivência da sexualidade desvinculada da reprodução, transformou a gravidez em perda de oportunidades da juventude.

No Brasil, observa-se uma redução da gravidez na adolescência desde o ano 2000. A frequência de NV de mães adolescentes varia entre regiões, pois é reflexo das condições econômicas, das diferenças culturais, do acesso aos serviços de saúde e aos métodos contraceptivos. Ela apresentou uma evolução na taxa de fecundidade brasileira, de acordo com os dados fornecidos pelo PNAD em 2009: em 1960, a média era de 6 filhos por mulher; em 2001, 2,33; em 2008, 1,89; e em 2009, 1,94.

Ela também apresentou a proporção de nascimentos Brasil em mães com até 19 anos, segundo ano de ocorrência. Brasil. 1996 – 2009:

Fonte: Sinasc/SVS/MS – 2008 e 2009 – dados preliminares

Tais dados serviram como base para um estudo transversal que ela desenvolveu com dados do Sistema de Informação sobre Nascidos Vivos (SINASC) do DATASUS, cuja população do estudo eram todas as mulheres que tiveram NV nos anos de 2000 a 2011 nas 5 regiões do Brasil. Nele, ocorreu a análise da frequência da gravidez na adolescência e a associação com o IDH de cada região.

Segundo o estudo em questão, dentre as características da gravidez na adolescência relatadas mais frequentemente estão: ausência de projeto futuro de vida; famílias com pouca estrutura; abandono da escola; início tardio do pré-natal; baixa aderência às orientações e reincidência. E os riscos obstétricos (tendências físicas) são anemia, DHEG, trabalho de parto pré-termo, baixo peso ao nascimento e aumento da mortalidade neonatal.

Contudo, é importante ressaltar que para além dos fatores de risco, a gravidez pode sim fazer parte dos projetos de vida de adolescentes e até se revelar, nesta faixa etária, como um elemento reorganizador da vida, ao invés de apenas desestruturador.

A Dra. Denise Monteiro concluiu dizendo que é necessário intensificar as estratégias de abordagem, a fim de que a gravidez na adolescência seja uma decisão própria e não consequência da falta de políticas públicas direcionadas ao adolescente.

Em seguida, a Prof. Dra. Valéria P. de Moraes, mestre em Saúde da Mulher e da Gestante pela Universidade Federal Fluminense (UFF) e Chefe de Clínica Obstétrica do Hospital Universitário Antônio Pedro (HUAP/UFF), ministrou uma palestra sobre controvérsias da obstetrícia em relação ao parto normal e a cesariana.

Segundo ela, a cesariana, por definição, consiste na extração do feto através de incisão na parede abdominal (laparotomia) e na parede uterina (histerotomia). O Brasil se apresenta como um dos países que mais realiza cirurgias cesarianas. Segundo o gráfico abaixo, o crescimento se deu de forma exagerada:

A Dra. Moraes, se direcionando para o público universitário, alertou os jovens médicos sobre a observação de uma série de riscos da cirurgia cesariana, especialmente em hospitais universitários, tais como a ausência de treinamento do médico obstetra na assistência ao parto de risco habitual e a ausência de treinamento do médico obstetra para solucionar distócias. Por isso, ela indicou que a cesariana deve ser realizada apenas quando está presente um benefício claro que pode compensar os custos elevados e os riscos associados à operação.

Prof. Dra. Valéria P. de Moraes (Centro Universitário da Serra dos Órgãos – UNIFESO)

Dando continuidade ao encontro, o Prof. Dr. Raphael Câmara contribuiu para a discussão questionando e explicando a controvérsia sobre a atuação das doulas. Doula, em grego, significa a mulher que serve. Segundo o Dr. Câmara, doulas são acompanhantes leigas – que não são profissionais de saúde necessariamente, mas que são treinadas (podendo ser, inclusive, analfabetas) a promover apoio contínuo às mulheres durante o trabalho de parto, o nascimento e o pós-parto.

É importante ressaltar, contudo, que o apoio em hipótese nenhuma está relacionado com as atividades médicas e/ou de enfermagem, embora muitas vezes haja conflitos entre doulas e médicos acerca de determinados procedimentos.

Desmitificando a atuação das doulas, elas são responsáveis pelo apoio durante o trabalho de parto, o que inclui oferecer suporte emocional, medidas de conforto, informações e intermediação a favor da parturiente (Cochrane). Dessa forma, o Dr. Câmara optou por adotar a sinonímia “Suporte ou apoio contínuo durante o parto”.

Segundo o Dr. Câmara, a atuação da doula é importante pois age como um amortecedor para o trato com complicados termos médicos, os procedimentos hospitalares, a eventual frieza da equipe de atendimento e aquela mulher que se encontra no momento mais vulnerável de sua vida. Ela também ajuda a parturiente a encontrar posições mais confortáveis para o trabalho de parto e parto, mostra formas eficientes de respiração e propõe medidas naturais que podem aliviar as dores, como banhos, massagens, relaxamento, etc.

Quando necessário faz moxabustão: acupuntura térmica (técnica que se usa calor nos pontos de Do-In/Acupuntura/Shiatsu), cromoterapia, massagens e muito mais, que é fruto da experiência de muitos partos em muitos anos. A sua atuação contribui para evitar que mulheres sejam manipuladas a optarem por uma cesárea por falta de informação adequada e embasada em evidências científicas.

Prof. Dr. Raphael Câmara

Em seguida, a Prof. Dra. Michele Pedrosa, da Universidade Estácio de Sá – UNESA/UFRJ, proferiu uma palestra sobre violência de gênero e cultura do estupro, alertando os alunos de Medicina sobre a importância do entendimento dos desdobramentos sociais e médicos dos mesmos.

Considera-se como violência contra a mulher todo ato baseado no gênero, que cause morte, dano ou sofrimento físico, sexual ou psicológico à mulher, tanto na esfera pública como privada.

No ano 2015, o Brasil registrou 48 mil casos de estupro, o que representa 24,5 por 100.000 habitantes. E, diante desses dados, a Dra. Michele traçou uma cadeia de argumentos machistas e problemas culturais acerca da cultura do estupro, colocando que essa mentalidade insiste em culpabilizar a mulher quando ela é assediada ou estuprada.

Torna-se, portanto, cada dia mais essencial que procuremos fortalecer uma cultura de educação de igualdade, suavizando o peso dos “papéis sociais” ligados a imagens construídas de gênero, abarcando as mulheres como donas de suas escolhas e penalizando os homens que objetificam e diminuem as mulheres nas diversas esferas da vida cotidiana.

O entendimento sobre o tema torna-se também urgente para a Medicina, especialmente para alunos de obstetrícia e ginecologia, já que a violência física ou sexual é um problema de saúde pública que afeta mais de 1/3 de todas as mulheres do mundo.

Dra. Michele Pedrosa (Universidade Estácio de Sá – UNESA/UFRJ)

Por último, o Prof. Dr. Alexandre JB Trajano, Professor Titular de Obstetrícia da Universidade Estadual do Rio de Janeiro e da Unigranrio, Coordenador do Núcleo Perinatal da UERJ e Professor do programa de Pós-Graduação da Faculdade de Ciências Médicas, contribuiu com a discussão introduzida pela Dra. Pedrosa discorrendo sobre violência sexual contra a mulher.

Segundo ele, o tema permeia hoje todos os setores da vida médica, tanto no âmbito pessoal, como profissionalmente. A Medicina, sobretudo na Medicina Obstetra, a maioria dos profissionais costuma ser do sexo feminino, e por isso ele considera mais do que urgente que o âmbito acadêmico esteja atualizado acerca das questões políticas que abrangem as mulheres.

Segundo a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher Convenção de Belém do Pará, de 1995, é toda ação ou conduta, baseada no gênero, que cause morte, dano físico, sexual ou psicológico, tanto no âmbito público quanto privado. De acordo com o Art. 5º da Lei nº 11.340, para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial.

Durante a palestra, assim como na discussão levantada pela Dra. Michele, foram expostos diversos casos que atravessam a esfera familiar e entram no plano de saúde. Por exemplo, no atendimento clínico dos hospitais públicos, é extremamente comum que médicos homens ajam e respondam a demandas habituais de um hospital de forma agressiva ou invasiva quando as pacientes são mulheres. A situação é urgente.

É preciso avançar e se conscientizar sobre o ponto de visto sobre violência e cultura machista, até mesmo no âmbito da Medicina, em que se acredita que todos os profissionais são educados e esclarecidos. Os dois professores alertaram para o fato de que essa cultura de agressão não estar associada a grau de instrução. Ele então alertou os estudantes de Medicina presentes no recinto que se informem ao máximo sobre as leis e formas de proteção da mulher e os convidou a garantir o sigilo, a segurança, a privacidade e o acolhimento a todos os seus pacientes de forma igual.

Ao final, o Prof. Dr. Trajano incitou um desafio forte para a gestão do setor de saúde, colocando que é necessário mobilizar e articular diferentes esferas da sociedade, fortalecer e potencializar ações e serviços, sensibilizar e capacitar profissionais de saúde em ações de diagnóstico, assistência, vigilância e prevenção, promover e incentivar estilos de vida saudáveis e promover ações de construção e exercício de cidadania.

Prof. Dr. Alexandre JB Trajano, (Universidade Estadual do Rio de Janeiro – UERJ/Unigranrio)

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