Os olhos das crianças¹ não são uma versão em miniatura dos olhos adultos. Ao nascer, o ser humano não fala, não anda e enxerga muito pouco se comparado aos adultos. Para que o desenvolvimento da visão seja pleno, é necessário que as estruturas oculares e do sistema nervoso, responsáveis pelo processamento visual, estejam normais ao nascimento. Assim, o desenvolvimento da visão se processa rapidamente nos primeiros meses de vida, sendo finalizado ao final da primeira década (Fig1).
Figura 1: Etapas do desenvolvimento visual – Foto Nicolas Slade
Fonte: Zin. A. Prevenção de cegueira Infantil: enxergando novos horizonte. Rio Pesquisa; p24-27. http://www.faperj.br/downloads/revista/rio_pesquisa_33_2015.pdf
A visão é muito importante para o desenvolvimento físico e cognitivo normal da criança. Gestos e condutas sociais são aprendidos pelo feedback visual e, sendo assim, o diagnóstico e tratamento precoce de situações que comprometam o desenvolvimento visual são muito importantes para o pleno desenvolvimento da criança.
Como as crianças não informam quanto enxergam, a avaliação da função visual baseia-se na habilidade de fixar luz e objetos, segui-los e manter a fixação do olhar (avaliação em ambos os olhos e em cada olho separadamente), na reação quando se oclui um dos olhos, se localiza e explora objetos. Vai variar de acordo com a faixa etária.
Até cerca de 3 anos, as crianças não informam a acuidade visual e a avaliação do comportamento visual permanece sendo utilizada.
Como a visão nos primeiros meses de vida de desenvolve rapidamente, para crianças menores de 6 meses recomenda-se a tabela a seguir:
A prevenção de problemas oculares se inicia no pré-natal. Durante a gestação, as estruturas oculares são muito vulneráveis a danos genéticos ou teratogênicos que podem causar malformações. As infecções congênitas, tais como toxoplasmose, rubéola, sífilis e herpes podem afetar a estrutura ocular no período gestacional, justificando-se a preocupação com a identificação e o tratamento precoce da gestante e do recém-nato. Mais recentemente a infecção congênita pelo zika vírus também pode comprometer não apenas o desenvolvimento do sistema nervoso, como também o ocular. A exposição ao álcool e drogas ilícitas (cocaína e crack), a medicações (talidomida, misoprostol, benzodiazepínico) podem igualmente interferir no desenvolvimento visual. A identificação precoce durante o pré-natal dessas condições permite orientação da família acerca da possibilidade de que possa haver algum comprometimento ocular e intervenção precoce quando estiver indicado.
O teste do reflexo vermelho (TRV) é uma ferramenta de rastreamento de alterações que possam comprometer a transparência dos meios oculares, devendo ser realizado pelo pediatra nos 5 primeiros anos de vida, de acordo com as Diretrizes de Atenção à Saúde Ocular na Infância, do Ministério da Saúde (2013).
Os problemas oculares que podem levar a comprometimento da transparência dos meios oculares são: catarata (alteração da transparência do cristalino), glaucoma (aumento que pressão ocular que aumenta o diâmetro da córnea e altera sua transparência), toxoplasmose (infecção que leva a alteração da transparência do vítreo pela inflamação), retinoblastoma (alteração da transparência do vítreo por tumor intraocular) e descolamentos de retina tardios. Mas importante é deixar claro que o TRV não é um teste diagnostico, não sendo adequado para identificação precoce de tumores oculares ou descolamento de retina.
Sendo assim, o TRV viabiliza a detecção de potenciais causas de anormalidades oculares tratáveis, a adequada orientação terapêutica, o aconselhamento genético e outras condutas de suporte às doenças oculares detectadas (catarata, glaucoma, retinoblastoma, anormalidades da retina, doenças sistêmicas com manifestações oculares, erros refrativos elevados). A caderneta da criança disponibilizada pelo Ministério da Saúde dispõe de um campo para anotação se o reflexo vermelho foi alterado ou não (página 12 da caderneta) e que deve ser preenchido pelo pediatra. De acordo com as Diretrizes de Atenção à Saúde Ocular na Infância (Ministério da Saúde, 2013),todos os nascidos devem ser submetidos ao TRV antes da alta da maternidade e, pelo menos, duas a três vezes ao ano, nos três primeiros anos de vida e pelo menos menos 1 vez de 3-5 anos. Uma vez detectada qualquer alteração, o neonato precisa ser encaminhado para esclarecimento diagnóstico e conduta precoces em unidade oftalmológica especializada.
Autores:
Olivia Zin – Hospital dos Servidores do Estado
Andrea Zin – Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira (IFF), da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Instituto Brasileiro de Oftalmologia (IBOL)
Oswaldo Moura Brasil – Membro Titular da Academia Nacional de Medicina