Quase dois séculos a serviço da saúde
No dia 30 de junho, a Academia Nacional de Medicina completou 191 anos e, como é tradição, uma cerimônia reuniu mais de 240 participantes. Neste ano, de forma virtual. Como estabelece o costume, o Secretário Geral da ANM, o cirurgião Ricardo José Lopes da Cruz, fez um balanço das atividades nesses últimos seis meses.
O orador, o médico e pesquisador Manassés Claudino Fonteles, inspirou-se em Hannah Arendt ao lembrar que ninguém experiencia sozinho, seja para o bem ou para o mal e, nesse sentido, os confrades e confreiras têm um papel fundamental no desenvolvimento da medicina e das ciências médicas. Fonteles, muito emocionado, reverenciou à memórias dos membros falecidos, neste último ano, e saudou os novos membros honorários.
O atual presidente da ANM, professor Rubens Belfort Jr., lançou um vídeo e um folder pelos 191 anos da instituição e falou das obras e dos Anais que serão publicados em breve. Para ele, o mais importante é a preservação da ANM.
– Nós não somos imortais. Somos mortais. O que não morre é o ideal da nossa Academia de Medicina.
Durante a cerimônia, Belfort anunciou os vencedores dos prêmios da ANM 2020, considerados os mais antigos, pois foram instituídos em 1829. Foram 63 candidaturas – um número recorde -, que concorreram a nove categorias.
O grande prêmio Presidente da Academia Nacional de Medicina foi para um grupo que reúne médicos das universidades Federal do Espírito Santo, Federal de São Paulo e da Columbia University sobre avanços para o tratamento da principal doença oftalmológica relacionada à perda da visão em adultos maiores de 55 anos: a Degeneração Macular Relacionada à Idade. O grupo estudou moléculas pró e antiangiogênica que podem contribuir para vascularização ocular e a aplicação dos sistemas CRISPR-Cas para edição do genoma, também conhecida como “cirurgia genômica” no campo da Oftalmologia.
Outro trabalho vencedor da edição do 2020 dos prêmios da ANM aborda as técnicas para transplante de fígado. De um grupo de médicos da Unidade de Transplante de Fígado, do Hospital Universitário Oswaldo Cruz, da Universidade do Estado de Pernambuco, o trabalho original acompanhou 87 pacientes submetidos ao procedimento, entre 2018 e janeiro de 2020. Foram analisadas duas técnicas cirúrgicas e diversos parâmetros entre os pacientes. Os resultados contribuem para indicar qual técnica gera menos instabilidade pós-cirurgica e que leva ao melhor funcionamento do enxerto após o transplante. Este trabalho venceu na categoria Prêmio Presidente José Cardoso de Moura Brasil.
História
Fundada no reinado do imperador D. Pedro I, a Academia Nacional de Medicina, de forma frequente, recebia D. Pedro II que, por mais de 50 anos, foi um assíduo ouvinte das conferências sobre ciência e saúde. Sua cadeira permanece no Salão Nobre da instituição, até os dias atuais. Com enfermidade avançada, no dia 30 de junho de 1889, presidiu pela última vez, a sessão de aniversário da instituição.
Em 2020, com a chegada da pandemia pelo novo coronavírus, suas habituais sessões científicas foram transferidas para o universo online, no qual o presidente Belfort estabeleceu uma agenda que aborda, prioritariamente, vários aspectos do SARS-CoV-2, desde março. Já os tradicionais chás acadêmicos foram suspensos pela primeira vez.
De 1829 a 2020, a Academia elegeu apenas um seleto grupo de 674 médicos brasileiros que ocupam uma das 100 cadeiras divididas entre as três Secções de Cirurgia, de Medicina e Ciências Aplicadas à Medicina, tendo Oswaldo Cruz, Carlos Chagas, Carlos Chagas Filho e mais recentemente Adib Jatene e Ivo Pintanguy como alguns dos seus ilustres membros titulares,
Histórias pitorescas recheiam a trajetória da Academia Nacional de Medicina como a entrada da primeira mulher, Marie Josephine Mathilde Durocher, eleita em 1871. Parisiense, veio para o Brasil aos sete anos e, já naturalizada, matriculou-se no curso de Partos da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, em 1833. Para trabalhar como parteira e não sofrer descriminação, adotou uma indumentária masculinizada, vestindo-se de preto, com casaco, gravata, cartola e saia.
Famosas também foram as atuações da Academia Nacional de Medicina nas campanhas de saneamento, vacinação e durante o enfrentamento de outras epidemias como a de febre amarela, no início do século passado, e a pandemia de 1917. Credenciais que atraem novos médicos para o seu Programa de Jovens Lideranças Médicas, coordenado pelos acadêmicos Marcello Barcinski, Eliete Bouskela e Antonio Egídio Nardi.