Estabelecido em 2007, durante a 60ª Sessão da Assembleia Mundial da Saúde, o Dia Internacional de Luta contra a Malária busca promover conhecimento sobre a doença e despertar a atenção das pessoas, dos governantes e dos profissionais que atuam na área da saúde para uma doença que atinge milhões de pessoas em todo o mundo.
Em 2015, aproximadamente 3,2 bilhões de pessoas estavam em risco de contrair malária. Os dados são da Organização Pan-americana da Saúde, que em 2019 lançou iniciativa “Municípios eliminando a malária”, com o objetivo de reunir diferentes atores com o fim de apoiar os esforços locais para adotar medidas efetivas contra a doença, em especial na região das Américas, onde o número de casos é mais concentrado.
Por estas razões, a Academia Nacional de Medicina, instituição que tem como objetivo estatutário “responder às perguntas do Governo sobre tudo o que interessar à saúde pública e principalmente sobre as epidemias, as moléstias de certos países, as epizootias, os diferentes casos de medicina legal, a propagação da vacina e investigações que puderem concorrer para o progresso da arte de curar”, realizou, na última quinta-feira (25), o seu Simpósio em comemoração à data. Sob a liderança do Acad. Cláudio Tadeu Daniel-Ribeiro e com o apoio da Fundação Oswaldo Cruz, diversos especialistas se reuniram no anfiteatro Miguel Couto.
O Simpósio foi iniciado com a apresentação da Dra. Cristina Ferreira de Alves Brito (Fiocruz – BH), que abordou “A Malária em Primatas Não-Humanos e a Transmissão Zoonótica na Mata Atlântica”, expondo dados sobre a epidemiologia da Malária no Brasil. Chamou atenção para o fato de que 99,7% dos casos registrados ocorrem na região da Amazônia legal e que o ano de 2017 registrou um aumento de 51% no número de casos em comparação ao ano de 2016, com um total de 194.365 casos.
Ressaltou que o combate à malária nas regiões de Mata Atlântica apresenta inúmeros desafios adicionais, que incluem a identificação de indivíduos com malária importada, o monitoramento da transmissão zoonótica, implementação de vigilância epidemiológica e a identificação das espécies de primatas não-humanos que atuam como reservatório da doença.
Discorrendo sobre os surtos de malária e febre amarela no estado do Rio de Janeiro, o Dr. Ricardo Lourenço de Oliveira (Fiocruz – RJ) buscou investigar quais seriam os principais fatores envolvidos nas gêneses dos surtos dessas doenças no sudeste do Brasil. Em quadro comparativo, ressaltou que a deficiência na propagação de informações sobre ambas as doenças é um importante fator a ser considerado, uma vez que, com o advento das redes sociais, cada vez mais circulam informações inverídicas acerca da natureza das doenças e sua transmissão. Chamou atenção para o fato de que o sucesso das políticas ambientais dos últimos anos favoreceu ainda mais as condições de proliferação e dispersão de mosquitos arbóreos e macacos e, consequentemente, a transmissão de arbovírus e plasmódios. Salientou, ainda, que novas práticas e a disseminação de um estilo de vida voltado para o contato com a natureza aproximou as pessoas dos ciclos de transmissão silvestre e de agentes infecciosos.
Todavia, na conclusão de sua apresentação, ressaltou a importância de reconhecer a complexidade destes fenômenos e sua natureza multifatorial, necessitando, portanto, de investigações multidisciplinares articuladas e bem orquestradas para sua compreensão e ação por parte dos agentes governamentais e da própria população.
Na sequência, coube ao Dr. Leonardo José de Moura Carvalho (Fiocruz – RJ) abordar “A Vasculopatia na Malária Cerebral”, apresentação na qual buscou responder à questão de como melhorar a eficácia do tratamento para diminuir a mortalidade e a incidência de sequelas neurológicas na malária cerebral. Por meio da apresentação de diferentes estudos utilizando modelos animais, o Dr. Leonardo Carvalho demonstrou que a disfunção de óxido nítrico contribui para a reatividade arteriolar cerebral prejudicada na malária cerebral e que a suplementação do aminoácido L-arginina pode auxiliar no tratamento.
Discorrendo acerca da “Malária no Contexto da Medicina de Viagem”, o Dr. Marcos Boulos (Secretaria de Estado de Saúde – SP) ressaltou que ações simples podem ter um grande impacto na diminuição no número de casos e nas taxas de mortalidade da doença, chamando atenção para o aumento recente nos índices de infecção no país nos últimos anos. Segundo o palestrante, questões de natureza política acabaram por inviabilizar anos de ações concretas e eficazes para o combate da doença.
Abordando as recomendações para os viajantes, destacou que a quimioprofilaxia não deve ser considerada como primeira opção, afirmando que os viajantes devem considerar fatores como o estilo e a duração da viagem, quando a mesma será realizada e obter informações sobre se o local de destino é uma área de baixa ou alta infecção. A partir daí, é possível que sejam tomadas medidas de proteção contra o mosquito, que incluem o uso de repelentes, estar alerta para o pico, tempo e locais de exposição, uso de roupas apropriadas e mosquiteiros e evitar as regiões com epidemias.
Apresentando o trabalho desenvolvido pela ONG Médicos Sem Fronteiras (MsF), o Dr. Rafael Sacramento iniciou sua conferência fazendo uma breve apresentação sobre o trabalho desenvolvido pela ONG, que atua em 462 projetos em 72 países. O trabalho dos Médicos Sem Fronteiras é baseado em três princípios: neutralidade, independência e imparcialidade, o que possibilita uma maior penetração em áreas de difícil acesso para órgãos governamentais.
Acerca da malária, chamou atenção para o fato de que a doença mata, a cada ano, quase 500 mil pessoas, dentre as quais quase 90% ocorrem no continente africano. Ressaltou que ao longo da história da humanidade, nenhuma outra doença infecciosa matou tanto quanto a Malária e que grande parte das populações expostas à doença sofrem com a falta de acesso a cuidados primários. Nesse sentido, destacou o trabalho de capacitação de líderes comunitários na aplicação de testes diagnósticos rápidos. Por fim, salientou que o trabalho mais importante de qualquer entidade que se proponha a trabalhar nestas áreas é dar voz a estas pessoas.