Conferência sobre Saúde Pública e Medicina Translacional

15/05/2016

No dia 12 de maio, a Sessão Plenária da Academia Nacional de Medicina recebeu como convidado do dia o Dr. Carlos Medicis Morel, Diretor do Centro de Desenvolvimento Tecnológico em Saúde (CDTS) da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).

O Dr. Morel é formado em Medicina pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e se tornou doutor em Ciências pelo Instituto de Biofísica Carlos Chagas e, atualmente, além de exercer importante função dentro do CDTS na Fiocruz, é Membro Titular da Academia Brasileira de Ciências.

Em sua carreira acadêmica, já recebeu diversas comendas e prêmios, como a Ordem Nacional do Mérito Científico, Classe Grã-Cruz; Prêmio Cidade do Rio de Janeiro em Ciência e Tecnologia; Doutor Honoris Causa pela UFPE.

Antes do início da palestra, o Presidente Francisco Sampaio convidou os Acadêmicos presentes a permanecerem em silêncio por um minuto em homenagem ao falecimento do Membro Titular da Cadeira 19, Acad. Clementino Fraga Filho e, após fazê-lo, apresentou uma breve biografia sobre ele.

O Dr. Clementino matriculou-se na Faculdade de Medicina da Universidade do Brasil em 1934. Em maio de 1940, foi nomeado assistente de clínica médica da Faculdade Nacional de Medicina. Em 1944, conquistou o título de livre-docente na UFRJ.

Durante 18 anos de exercício da cátedra, chefiou o serviço de clínica médica no Hospital da Santa da Casa de Misericórdia, até ser convocado para tarefas administrativas. A partir de 1954, foi diretor do Instituto de Nutrição da Universidade do Brasil, onde permaneceu por 12 anos.

Em 1957, foi eleito titular da Academia Nacional de Medicina. Em 1966, foi eleito vice-reitor da universidade e assumiu a reitoria dias após, em virtude do afastamento do então reitor Raymundo Moniz de Aragão. Durante essa gestão, incorporou ao patrimônio da universidade, em definitivo, o campus da Praia Vermelha.

Em 1974, foi nomeado diretor da Faculdade de Medicina da UFRJ. Foi, então, designado pelo reitor Hélio Fraga para presidente da comissão de implantação do Hospital Universitário. Inaugurado o hospital, em 1º de março de 1978, foi seu diretor geral até outubro de 1985.

Em 1986, após aposentar-se no cargo de professor titular, foi eleito professor emérito da UFRJ. Pouco depois, recebeu a medalha de ouro por 50 anos de serviços prestados à universidade e, graças à decisão do conselho universitário, teve seu nome dado ao Hospital Universitário.

Acads. Antonio Egídio Nardi, Francisco Sampaio (Presidente), Claudio Cardoso de Castro e Claudio Tadeu Daniel-Ribeiro e o palestrante convidado Prof. Carlos Morel

Após a apresentação destas informações em homenagem ao Acadêmico falecido, o Dr. Carlos Medicis Morel deu início à sua apresentação, iniciando-a com uma indagação interessante: será que a Saúde Pública e Pesquisa Biomédica consistem mundos à parte ou áreas que se fertilizam?

Para buscar delinear uma resposta à pergunta feita, ele apresentou uma linha do tempo contendo algumas datas importantes para o entendimento da Saúde Pública e de inovações em Saúde:

Segundo o Dr. Morel, na década de 90 a Organização Mundial da Saúde (OMS) era vista como confusa, sem prioridades claras e sem liderança bem definida – o que levou o Banco Mundial a ocupar um espaço privilegiado, dedicando o seu Relatório Anual de 1993 ao tema “Investir em Saúde: Indicadores de Desenvolvimento Mundial”.

Influenciada por este documento, a OMS publica no ano 2000 as conclusões da Comissão de Macroeconomia e Saúde, também com o título “Investir em Saúde”. A influência destes documentos nas políticas globais de saúde, adotadas desde então, ficou clara com a publicação, em 2013, pela prestigiosa revista Lancet, de artigos comemorando os 20 anos do Relatório do Banco Mundial, sob o título “Saúde Global 2035: o Mundo Convergindo em uma Geração”.

Enquanto esta corrente de economistas em saúde seguia esta linha, abordada em detalhes durante a palestra, os mundos das Ciências Biomédicas e da Medicina avançavam vertiginosamente com descobertas revolucionárias, como por exemplo, as resultantes do Projeto Genoma Humano em 2000-2003.

Segundo ele, tratava-se de um projeto muito relevante e portador de grandes avanços, mas que não conseguiu gerar novos medicamentos, como era previsto.

Evidenciou-se então um paradoxo: estes avanços levaram a muitas promessas de novos produtos e processos como novas vacinas, novos medicamentos, novas tecnologias de diagnóstico – mas que não saiam do papel.

Em 2008 este hiato foi denominado “Vale da Morte”, ilustrando a dificuldade de transformar um novo conhecimento em um produto de uso pela sociedade; em outras palavras, como traduzir um novo conhecimento em uma inovação usada na clínica. Nascia assim, a Pesquisa Translacional, também chamada de Medicina Translacional ou ainda de Ciência Translacional.

Ilustração do “Vale da Morte”, entre a Pesquisa Biomédica (de um lado) e a clínica/pacientes de outro, com os cadáveres no vale.

Esta separação entre o mundo da Saúde Pública, por um lado, e o mundo da Medicina e da Inovação, por outro, foi objeto agora em 2016 de uma nova coleção de artigos, editada por Gavin Yamey e Carlos Morel, sobre o tema “Grande Convergência: Alinhando Tecnologias e Realidades em Saúde Global”.

Nesta coleção de nove artigos Yamey & Morel defendem a tese de que sem inovação em saúde a “Grande Convergência 2035” ou os “Objetivos de Desenvolvimento Sustentável“ nunca poderão ser alcançados. Baseados em dados históricos sobre o papel da inovação em saúde no desenvolvimento da vacina contra a poliomielite e no sucesso da campanha de erradicação da varíola, os artigos relatam a necessidade de investimento em inovação em um Editorial, duas revisões e seis estudos de caso: saúde materno-infantil, tuberculose, malária, HIV/AIDS e doenças tropicais.

Na última parte da palestra o convidado chamou a atenção para a emergência de novas doenças, ilustrando os desafios das “Emergências de Saúde Pública de Relevância Mundial” relatando a experiência recente com as epidemias de Ebola na África Ocidental e de zika na América do Sul e Caribe.

Como conclusão demonstrou o papel positivo da contribuição da medicina e das ciências biomédicas do Brasil na identificação e combate da epidemia de zika, em contraste com o ocorrido na epidemia de Ebola, cujo combate teve de ser feito por forças-tarefas internacionais. Nas palavras de um eminente cientista norte-americano, Peter Hotez, “a conexão entre microcefalia e zika teve uma impressionante contribuição de cientistas brasileiros, uma história merecedora de um Prêmio Nobel”.

A conclusão final da palestra resume a abordagem adotada e o conteúdo: Políticas econômicas apregoadas há décadas, que prometem ‘revoluções’ ou ‘convergências’ em saúde, só serão bem-sucedidas se escudadas em novas intervenções e ferramentas, frutos de inovação tecnológica e social.

Acadêmico e ex-Ministro da Saúde do Ministério da Saúde, José Gomes Temporão, comentando a apresentação do Dr. Morel.

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