“Machado de Assis foi membro da Academia Imperial de Medicina, hoje, ANM. No final de sua vida, a epilepsia era nítida e sofrida – motivo de grande embaraço para Machado. Para ele, era a sombra da loucura. Ele se referia à doença como ausência do corpo e da alma”, destacou Hélio de Seixas Guimarães, da USP, durante o Programa de Verão da Academia Nacional de Medicina, realizado no dia 21 de janeiro de 2021.
“Há sempre um risco de redundância ao se falar de Machado de Assis, sobretudo quando se trata de psiquiatria e como ele narrava a alma humana. Nos aspectos psicológicos em seus escritos, ele relatou a inveja, as angústias, as paixões, o orgulho, a rivalidade, o conflito entre o bem e o mal e trouxe uma riquíssima contribuição à psiquiatria”, acrescentou Marco Antônio Brasil, da Faculdade de Medicina da UFRJ.
Ainda segundo Marco Antônio Brasil, Machado de Assis iniciou uma análise profunda da alma humana e antecipou muito para psiquiatria. “Ele tornou-se o primeiro antipsiquiatra do mundo e legitimou a loucura.”
Citando uma cena de Quincas Borba da obra Machadiana, Marco Antonio descreve a cena em que, diante de uma casa em ruínas, o personagem da ficção pergunta: “posso acender um charuto?” Segundo o palestrante, uma analogia à questão da dor alheia; descrita também por Susan Sontag como a exposição da dor alheia e o suporte da imagem na contemporaneidade”.
Segundo Sigmund Freud “os poetas e os filósofos descobriram antes de mim o inconsciente, o que eu descobri foi o método científico que o inconsciente pode ser estudado”. O limite que se descreve entre o estado mental normal e o patológico é tão convencional e variável que é prova que cada um de nós o transponha um dia,” complementou.
Machado de Assis era conhecido por seu pessimismo irônico, mas em uma frase ele destaca a esperança, que serve bem para os tempos atuais que vivemos: “Essa persistência em crer, quando tudo se ajusta, para descrer, mostra que a pessoa é forte. Fé e esperança, uma não caminha sem a outra,” finalizou.
O encontro virtual contou ainda com as palestras: “A convulsão do corpo: o Machado de Silviano Santiago”, com Pedro Meira Monteiro, da Princeton University, dos Estados Unidos; “Sintoma, doença e delírio: dissimulações machadianas”, com Marta de Senna, também da UFRJ e da Fundação Casa de Rui Barbosa; e os comentários do acadêmico Mário Barreto Corrêa Lima.
O inédito Programa de Verão da Academia Nacional de Medicina faz parte da série de eventos em homenagem ao acadêmico Ricardo Lopes da Cruz (in memoriam– 1954/2020).
O simpósio foi presidido pelo acadêmico Marcello Barcinski e teve a coordenação da médica Marta de Senna. “Ricardo Cruz é referência em aproximar a medicina a diferentes áreas do saber. Por isso, estamos prestando essa homenagem a ele”, destacou Barcinski.
“A inteligência transbordava nele, um homem que se destacou em tudo que fez. Ricardo Cruz era particular, próprio, ele não era igual a outras pessoas. Ele colocava a marca de sua excelência em tudo que fazia. Ele era um ponto fora da curva. Entendia a alma humana e a alma da ANM, um dom. Ricardo faz e fará muita falta. Meu amor por ele”, desabafou emocionado o acadêmico José Horácio Aboudib Jr.