Vacinas contra covid
Imagine ter a disposição uma variedade de imunizantes contra covid-19. E aí, qual a melhor opção para vacinação em massa e para vacinar grupos especificos? Estas perguntas mobilizaram cerca de 350 participantes durante o simpósio “Vacinas e covid-19: Qual, quando, como, em quem? Medicina, mercado, política e sociedade”, promovido por um consórcio que reuniu as Academias Nacional de Medicina (ANM), Brasileira de Ciências (ABC) e de Ciências Farmacêuticas do Brasil (ACFB), e realizado na última quinta (17).
Para quem anseia por uma vacina contra covid-19, o Secretário de Relações Exteriores da Academia Nacional de Medicina dos Estados Unidos, Carlos del Rio, lembrou alguns exemplos de desenvolvimento de vacinas que levaram cerca de 30 anos: contra a varicela foram 28 anos. Outros 15 anos foram necessários para desenvolvimento tanto da vacinas contra o HPV, como para o rotavirus. E pesquisadores do mundo todo sonham em desenvolver uma vacina contra covid em apenas 18 meses. Será possível?
A brasileira Mariângela Simão, atualmente na Organização Mundial da Saúde, sentenciou queessa pandemia não é uma corrida de 1000m. É uma maratona! Num otimismo cauteloso, segundo ela, a OMS estima que a vacina contra a covid-19 ficará pronta até meados de 2021, mas possivelmente, só haverá vacina para cerca de 20% da população. Com isso, será necessário eleger os grupos essenciais que receberão o imunizante e incorporar ao cotidiano medidas preventivas como o uso de máscaras, distanciamento social, lavagem das mãos ou uso de álcool em gel.
Imunizantes – Uma das questões importante abordadas por um dos coordenadores do evento, o pesquisador Jorge Kalil (ABC), e ainda sem resposta é quão prolongada será a resposta imunológica à vacina. Segundo ele, ainda não se sabe, mas todos os grupos estão tentando estudar as células de memória e fazer uma projeção. Alguns apontam que os anticorpos se mantêm, “mas não sabemos se os anticorpos são suficientes para manter a imunidade. Talvez, seja necessária também uma resposta celular”, afirmou.
Além disso, Kalil comentou sobre as perspectivas da vacina acabar realmente com o vírus (esterilizante) ou só evitar que os indivíduos desenvolvam a forma grave da doença. Isso, segundo ele, poderá ter impacto na saúde pública, pois os indivíduos não terão a doença, mas continuarão a disseminar o vírus.
Vacinas por RNA, DNA, vetores virais, adenovirus de chipanzé e baseadas em proteínas foram ainda apresentadas e discutidas por vários convidados durante o evento.
A pesquisadora Lily Yin Weckx, da Unifesp, e Maria Bernardini, diretora médica da Astra Zeneca, esclareceram por que o país desperta o interesse de vários grupos internacionais para testes de vacina, destacando a excelência dos grupos de pesquisadores brasileiros e o número de infectados no país. Lily Yin mostrou como é a composição da vacina de Oxford que utiliza vetores virais modificados de chipanzé, onde se insere a proteína do SARS-CoV-2, o que desecadeará uma resposta imune.
Entre outras iniciativas apresentadas, as estratégias da GlaxoSmithKline que visa uma vacinação em massa. Segundo o presidente José Carlos Felner, a empresa pretende lançar apenas no fim de 2021 a melhor solução de imunizante, que inclua a distribuição e que atinja ao maior número de pessoas.
Outro convidado do evento foi o pesquisador Esper Kallás, da USP, que contou sobre a iniciativa dos testes com a vacina Coronavac, do Butantan/Sinovac, conhecida como a vacina chinesa.Cerca de 4.700 voluntários no São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Paraná e Rio Grande do Sul estão participando dos testes que tem uma projeção de atingir um total 8.870 voluntários.
A epidemiologista Carla Domingues, outra palestrante do evento, ressaltou a excelência do Programa Brasileiro de Imunizações, mas alertou que o Ministério da Saúde precisa pensar na logística da vacinação para covi-19. Como será a vacinação, por exemplo, nas cidades ribeirinhas, onde o acesso é feito por barcos, caso a vacina necessite de refrigeração? Teremos seringas e agulhas suficientes para vacinar a população?, questionou Domingues.
O presidente da ANM, Rubens Belfort, ressaltou ao longo do simpósio a importância da boa evidência científica e da comunicação eficaz junto à sociedade para evitar a politização da vacinação.
– Se por um lado, defendemos a evidência científica, somos os primeiros a admitir que elas são, às vezes, transitórias. Dizem que a medicina é um conjunto de ideias passageiras, transformadas em leis por questões didáticas e comerciais. E as vacinas também estão nessa área. Por isso, temos que ter muita responsabilidade para explicar que as evidências, às vezes, ainda são frágeis e, principalmente, mudam com o tempo.
O assunto foi reforçado pelo presidente da Academia Brasileira de Ciências, Luiz Davidovich. Segundo ele, a ciência não tem verdades. Ela busca a verdade. Se tivesse verdades permanentes, não seria ciência. Precisamos estar atentos ao interesse do público, pois temos grande responsabilidade de transmitir os avanços e processos científicos de forma clara e mostrar que o tempo da ciência é diferente do tempo dos políticos.
O jornalista e ex-Governador do Rio Grande do Sul, Antonio Britto, complementou as reflexões e preocupações. Ele interrogou quem estará no comando da imunização? A vacinação não pode ser palco de disputas ideológicas e corrupção como assistimos em várias cidades do país durante a pandemia de covid-19, enfatizou. O diretor da BandNews, Marcello D’Angelo, somou a essa preocupação:
– Na pandemia por covid-19, assistimos perplexos muitos casos de desvio de conduta em diversos governos estaduais, como os episódios no Rio de Janeiro, Santa Catarina e outras cidades. Também acompanhamos as disputas de vários países por máscaras, respiradores e outros equipamentos. E, infelizmente, estas negociações tiveram interferências políticas que mudaram os rumos de aquisição dos insumos. Essa situação não pode se repetir com a vacina, disse D’Angelo.
Participaram ainda dos debates, os acadêmicos da ANM, Celso Ferreira e Marcelo Morales, representando o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, que falou sobre os investimentos governamentais; os acadêmico da ABC, Ricardo Gazinelli; Marco Antonio Stephano e Nelson Mussolini, da Academia de Ciências Farmacêuticas do Brasil.